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Ives gandra da silva martins


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IVES GANDRA DA SILVA MARTINS,

Professor Emérito das Universidades Mackenzie, UNIP, UNIFIEO, UNIFMU, do CIEE/O ESTADO DE SÃO PAULO, das Escolas de Comando e Estado-Maior do Exército - ECEME, Superior de Guerra - ESG e da Magistratura do Tribunal Regional Federal – 1ª Região; Professor Honorário das Universidades Austral (Argentina), San Martin de Porres (Peru) e Vasili Goldis (Romênia); Doutor Honoris Causa das Universidades de Craiova (Romênia) e da PUC-Paraná, e Catedrático da Universidade do Minho (Portugal); Presidente do Conselho Superior de Direito da FECOMERCIO - SP; Fundador e Presidente Honorário do Centro de Extensão Universitária - CEU/Instituto Internacional de Ciências Sociais - IICS.



CRIAÇÃO DE SUBSIDIÁRIA INTEGRAL NOS TERMOS DO ARTIGO 50, INCISO II, DA LEI Nº 11.101/05, OBJETIVANDO GERAR RECURSOS PARA SALDAR OBRIGAÇÕES DE EMPRESA EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL. AS EMPRESAS CRIADAS NOS TERMOS DOS REFERIDOS DISPOSITIVOS NÃO CARREGAM AS RESPONSABILIDADES DA EMPRESA EM RECUPERAÇÃO. DECLARAÇÃO DE INIDONEIDADE DA EMPRESA MÃE NÃO SE TRANSFERE PARA A EMPRESA CRIADA POR DETERMINAÇÃO JUDICIAL. PARECER.


CONSULTA
O consulente, consórcio constituído de diversas empresas, venceu licitação aberta pelo Governo do Estado, com diferença a favor desta unidade da Federação, no preço final orçado, de um bilhão de reais em relação ao segundo colocado.

Entre as empresas conformadoras do consórcio está subsidiária integral, empresa “b” criada por determinação judicial para atuar no segmento em que atuava empresa “a”, empresa em recuperação judicial, após pormenorizados estudos de sua viabilidade econômica.

A criação por determinação judicial, preenchidos todos os requisitos necessários para instituí-la em juízo, objetivou permitir que, operando sem as amarras e sem as responsabilidades carregadas pela empresa “a”, pudesse gerar recursos que auxiliassem a empresa da qual derivou, a saldar suas obrigações, no tempo e nos termos acordados pelo magistrado perante o qual corre o feito, algo impossível de obter-se pela inoperacionalidade da Empresa “a”.

Embora tenha sido considerada inidônea, a empresa mãe, nos termos do artigo 87 inciso IV da Lei 8666/93, para concorrer em licitações públicas federais, houve por bem S. Exª, com a concordância dos credores e após acurado exame de viabilidade econômica, autorizar a criação de subsidiária integral para operar, utilizando-se de técnicas, instrumentos e acervo de empresa “a”, no mesmo segmento que atuava a empresa recuperanda, sem trazer as vedações que lhe foram impostas, visto que seu escopo é permitir a recuperação judicial da empresa mãe, com os recursos que vier a obter.

Tendo-se consorciado, com pleno conhecimento de seus parceiros e do Poder Público, concorreu, o consórcio formado, e venceu licitação com larga margem de preço favorável ao Estado em relação ao 2º proponente. Em outra licitação, todavia, concorrente que perdera licitação em razão de proposta mais onerosa aos cofres estaduais, sob a alegação de que a declaração de inidoneidade apresentada à Empresa “a”, NADA OBSTANTE A LEI 11.101/05 E A DETERMINAÇÃO JUDICIAL PARA ATUAR NO MESMO SEGMENTO EMPRESARIAL DA EMPRESA MÃE, contaminara seu direito de concorrer a qualquer licitação, provocou o Tribunal de Contas do Estado, para que declarasse a inabilitação para tais efeitos da empresa constituída judicialmente, tornando, em decorrência, inócua sua criação e inútil a determinação judicial.

Embora a matéria esteja sendo examinada por aquela Corte, com parecer desfavorável da assessoria técnico jurídica (ATJ) do Departamento do Estado considerou absolutamente legal a licitação e a classificação em primeiro lugar da proposta apresentada pelo consórcio─ o consulente tem receio que o expediente levado ao TCE possa ter como intuito atingir o resultado favorável no concurso licitatório, visto que sua proposta foi classificada, repita-se, em primeiro lugar. Se assim agir o Tribunal de Contas do Estado restará desfigurada a autorização judicial, que se tornará sem qualquer eficácia para constituição da subsidiária integral.

Formula-me, em decorrência, as seguintes questões:

1) É legitima a operação de criação de subsidiária integral como mecanismo de processo de recuperação judicial, tal qual estabelece o inciso II do artigo 50 da Lei Federal nº 11.101/05? Em caso positivo, quais os objetivos e finalidades elementares da medida?

2) É correta a equiparação entre a operação de criação de subsidiária integral no bojo de processo de recuperação judicial com a chamada alienação de estabelecimento (sucessão empresarial), tal qual regulada pelos artigos 1.144 e seguintes do Código Civil? É possível afirmar que houve "sucessão empresarial" entre Empresa “a” e “b”?
3) É possível que uma sanção administrativa aplicada a uma empresa seja estendida a outra, que figura como sua subsidiária integral? No caso narrado, a sanção de declaração de inidoneidade aplicada à empresa Empresa “a” pode ser estendida à empresa “b”, sua subsidiária integral?

4) Qual o papel, no caso, do inciso XLV do artigo 5º da Constituição Federal? Nesse sentido, é juridicamente viável a pretensão de transferência à empresa “b” da sanção aplicada à sua controladora?

5) É juridicamente possível o sancionamento administrativo de um particular sem respectivo ato administrativo, impondo de forma fundamentada a penalidade? E sem processo administrativo sancionatório especificamente instaurado, com as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa?

6) Quais seriam os requisitos para a aplicação da teoria da desconstituição de personalidade jurídica? No caso narrado, encontram-se presentes tais requisitos? É possível falar, no caso em tela, em "abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial"? É possível a desconstituição da personalidade jurídica em sede administrativa, sem a instauração de processo administrativo específico?

7) O resultado da licitação que sagrou vencedor o Consórcio integrado pela empresa “b”, cuja proposta apresenta preço aproximadamente um bilhão de reais mais baixo que a do segundo colocado, foi vantajosa para o governo do estado?


RESPOSTA

Algumas breves considerações fazem-se necessárias, antes de responder às questões formuladas.

A primeira delas diz respeito à razão de ser da lei de recuperação judicial (nº 11.101/05) 1.

O pretérito Decreto-lei nº 7761/45, que durante décadas ordenou a discussão judicial no processo falimentar e no de concordata, de há muito se mostrava inadequado por não permitir a preservação de empregos, a função social da empresa, hoje tese pacificamente aceita na doutrina, jurisprudência e pelas visões política e sociológica dos governos. Ademais, não enfrentava a realidade empresarial no país e a competitividade internacional, onde os países desenvolvidos possuíam legislações mais adequadas. Por isto, sobreveio diploma legislativo criando mecanismos destinados a permitir o ressarcimento possível dos credores, afetados pela inadimplência da empresa em dificuldades 2, nos prazos e condições definidos judicialmente.

As concordatas, até o advento da nova lei, normalmente eram transformadas em falências e, nestas, os credores não chegavam a ser ressarcidos e a empresa, normalmente, desaparecia.

Depois de longos debates no Congresso, depois da Comissão de Notáveis ter subscrito o anteprojeto, foi aprovada a novel disciplina e sancionada a lei, tendo como fundamento maior o que explicitado está em seu artigo 47, assim redigido:

 “Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica” (grifos meus) 3.

Com efeito, na trilha de soluções criadas no direito comparado, que de há muito adotara instrumentos semelhantes, a nova formulação legislativa conformou um sistema pelo qual a empresa em dificuldades pode adotar “n” alternativas não colocadas em “numerus clausus” no artigo 50, objetivando não só recuperar a sociedade que buscou tutela judicial mediante a obtenção de recursos possíveis para saldar seus compromissos com os credores habilitados, mas, principalmente, para preservar empregos, capacidade concorrencial e efetiva recuperação de sua condição de geradora de riquezas no futuro.

Em outras palavras, através de variados instrumentos, mecanismos e soluções criou, o legislador, forma de superação da crise da empresa recorrente ao juízo, sem necessidade de destruí-la, como ocorria sob a legislação anterior 4.

Um dos mecanismos mais relevantes para a recuperação da empresa postulante é aquele colocado no inciso II do artigo 50, assim redigido:

 “Art. 50. Constituem meios de recuperação judicial, observada a legislação pertinente a cada caso, dentre outros:

       ............

        II – cisão, incorporação, fusão ou transformação de sociedade, constituição de subsidiária integral, ou cessão de cotas ou ações, respeitados os direitos dos sócios, nos termos da legislação vigente; ...” 5,

ou seja, a criação de empresas desvinculadas sobre variada conformação jurídica, capazes de, sem as amarras da empresa endividada, poder atuar livremente no mesmo segmento do mercado que aquela atuava, tendo a nova empresa a função de carrear recursos obtidos para a empresa recuperanda, com o intuito de saldar os compromissos com os credores habilitados.

À evidência, esta eliminação de amarras, inclusive para a obtenção de certidões negativas, não significa que não haja vinculação, qual seja, aquela de gerar os recursos necessários para a empresa mãe, pois para isto é que foi instituída.

Nitidamente, o grande diferencial que a lei proporcionou foi a possibilidade de a nova empresa (com o formato que tiver) atuar livremente no mercado, sem que o passado e a carga de inadimplência da empresa em recuperação, afete sua credibilidade. Para esta finalidade, a lei especial –a Lei nº 11.101/05 é uma lei especial— autoriza que a nova empresa geradora de recursos atue sem as limitações da empresa mãe da qual tenha recebido o acervo, inclusive tecnologia, equipamentos e até pessoal, para continuar suas atividades.

Em outras palavras, estando livre das amarras da inadimplência e da recuperação, a nova empresa, decorrente de fusão, incorporação, cisão e até na forma de subsidiária integral, continua a atuar na mesma área de ação da empresa em recuperação, sem o peso imediato das responsabilidades sucessórias. Assim, pode obter créditos no mercado, que a empresa em recuperação seria incapaz de obter 6.

Tal forma simples de solução financeira, semelhante à simplicidade da solução proposta por Colombo, para colocar um ovo em pé, revelou-se consideravelmente mais eficaz em benefício dos credores habilitados, como também na preservação de atividades da empresa mãe, gerando, pois, solução melhor de mercado, com preservação de empregos, funções e trabalhos.

Em termos diversos, por livrar a empresa nascida das amarras obrigacionais da empresa em recuperação para efeitos de atuação, embora com vinculação à obrigação de gerar recursos, a nova lei propicia um mecanismo de geração de receitas, que seria impossível obter pela empresa em recuperação, visto que sua credibilidade não lhe propiciaria recorrer ao mercado financeiro 7.

SÓ POR ESTA PERSPECTIVA tem a lei sentido e a criação da nova empresa razão de ser. Se não tivesse a possibilidade de atuar livremente, inclusive suspensas estando as obrigações devidas pela empresa mãe, sua criação SERIA DE INUTILIDADE SEMELHANTE À MAGNITUDE DO UNIVERSO.

Eis o motivo pelo qual sua instituição deve ser precedida de variados estudos, a fim de que se torne possível a recuperação. Vale dizer, devem ser analisados: a viabilidade econômica, campo de atuação, fontes de financiamento, mercado existente e outros elementos necessários para que a nova empresa seja capaz de atingir os desideratos do legislador 8.

Presidindo o processo de criação, o papel do magistrado é de particular relevância, pois, em última análise, é quem decide pela viabilidade ou não da criação de empresa que, livre de amarras, repito, pode melhor atuar no mercado financeiro para obtenção de crédito e obter melhores resultados, a fim de que a empresa em recuperação salde seus compromissos no tempo e forma pelo juiz determinados 9.

Ora, no caso concreto, em que a empresa Empresa “a” atuava no segmento de prestação de serviços públicos, à evidência, sua subsidiária, criada nos termos da Assembléia de credores e determinação judicial, foi constituída para atuar no mesmo segmento, com o objetivo primordial de obter recursos para carreá-los à empresa em recuperação.

Ora, se a subsidiária integral foi criada para atuar no setor de serviços públicos, sujeitos ao concurso licitatório, à evidência, se tivesse de carregar as vedações impostas à empresa em recuperação, certamente criar-se-ia UMA EMPRESA DE RIGOROSA INUTILIDADE, pois contaminada “ab initio” pela interdição imposta à empresa que lhe deu origem. Reitero, uma vez mais, que as condições de sua criação foram definidas pelo magistrado e pela Assembléia de seus credores 10.

Como homenagem à inteligência do legislador, não posso admitir uma interpretação amputadora do objetivo da lei.

A mesma homenagem presto ao meritíssimo juiz e à assembléia de credores, que aprovaram a sua criação, os quais não encamparam tal exegese restritiva.

Quero deixar claro, portanto, nesta primeira consideração, que as empresas criadas por força do artigo carregam apenas as condições definidas pela assembléia de credores e pelo juízo, e não as vedações da empresa mãe, incapacitada de atuar 11.

Uma segunda consideração faz-se necessária.

O artigo 2º da Lei de Introdução ao Código Civil está assim redigido:

Art. 2o  Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue. (Vide Lei nº 3.991, de 1961) (Vide Lei nº 5.144, de 1966)



§ 1o  A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.

§ 2o  A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior.

§ 3o  Salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência” (grifos meus) 12.

Como se percebe, entre os diversos aspectos que este isolado artigo permite vislumbrar – seu autor, Haroldo Valladão, em palestra que proferimos juntos em Belo Horizonte (1979), confidenciou-me que nunca imaginara que o texto escrito em 1942 tivesse tão longa duração - é que a lei geral não revoga a lei especial e esta pode conviver com aquela, a não ser que expressamente afastada sua vigência pelo novo diploma.

No presente parecer, é de se realçar dois aspectos. Os artigos 1144 e seguintes do Código Civil de 2002 e o artigo 87 da Lei 8666/93, que são anteriores às disposições da lei especial sobre recuperação, poderiam ser revogados por lei geral. Não o foram, mas seus dispositivos foram limitados, em muito de sua vigência, validade e eficácia, pela lei especial da recuperação de empresas 13.

Em outras palavras, se tais leis fossem posteriores, não revogariam as disposições especiais, por serem normas gerais. Como são anteriores, no que concerne à recuperação de empresas disciplinadas de forma especial, seus efeitos não podem incidir sobre o mais relevante mecanismo da lei nº 11.101/05, que é o da criação de nova empresa, nas diversas formas do inciso II do artigo 50, para dar continuidade às atividades de empresa em recuperação, SEM SUAS AMARRAS e restrições, com o único intuito de conseguir recursos para saldar os compromissos acordados no processo jurídico. E, quando há alienação do ativo ou de parte da empresa, o artigo 60 da Lei afasta, para os novos proprietários, a responsabilidade sucessória.

Como lei especial, não é possível a aplicação das disposições mencionadas nos dois diplomas para as empresas resultantes, por determinação judicial, da separação de parte do acervo da empresa em recuperação, objetivando geração de recursos destinados aos credores.

Não há, portanto, como pretender-se aplicar norma geral para situação regulada por norma especial posterior, prevendo tratamento diverso daquele que a norma geral dispunha 14.

Repito, uma vez mais, no caso do presente parecer, se se pudesse entender como aplicável a norma geral sobre norma especial da lei de recuperação, como se fosse norma de hierarquia superior - que não é -, A CRIAÇÃO DA SUBSIDIÁRIA INTEGRAL AUTORIZADA PELO DIGNO MAGISTRADO, SERIA DE UMA FANTÁSTICA INUTILIDADE, pois, tal como a empresa em recuperação, a nova empresa estaria impossibilitada de atuar junto ao poder público, o que vale dizer que, com ou sem ela, a situação da empresa em recuperação continuaria rigorosamente a mesma!!!

Não só estar-se-ia passando um atestado de absoluta insensatez ao magistrado e à assembléia de credores - o que repudio de imediato - como ter-se-ia gasto tempo, negociação com os credores, obtenção de laudos demonstrativos de sua viabilidade econômica e uma série de outras providências, por mero diletantismo acadêmico, pois, tanto a subsidiária quanto a empresa em recuperação estariam impossibilitadas de operar!!! E, mais do que isto, o espírito da lei (art. 47 e 50 inc. II) de recuperação judicial restaria rigorosamente fulminado, por ser de nenhuma valia!!! 15

À evidência, tal interpretação amputadora não é de se aceitar.

Uma terceira consideração faz-se necessária, esta de natureza constitucional.

O artigo 87, inciso IV, da Lei 8.666/93, assim redigido:

Art. 87.  Pela inexecução total ou parcial do contrato a Administração poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções:

...........

IV - declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública enquanto perdurarem os motivos determinantes da punição ou até que seja promovida a reabilitação perante a própria autoridade que aplicou a penalidade, que será concedida sempre que o contratado ressarcir a Administração pelos prejuízos resultantes e após decorrido o prazo da sanção aplicada com base no inciso anterior.

......” 16,

não se refere –e nem poderia— ao inciso II do art. 50 da lei posterior que, ao permitir a criação de nova empresa para gerar recursos para a empresa em recuperação, não lhe transfere a sanção de impossibilidade de atuação em licitações públicas.

Por outro lado, e tal aspecto é relevante, não declara que as penalidades a que está sujeita a empresa declarada idônea transferem-se a qualquer empresa a que esteja vinculada como coligada, controlada ou sua subsidiária integral.

Em outras palavras, não há transferência da sanção para qualquer das empresas vinculadas, e tal princípio decorre da própria lei maior, que determina, no artigo 5º inciso XLV – e é cláusula imodificável da Constituição--- que:



XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens serem, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido; ...” 17.

Por tal dispositivo, os sucessores que receberam bens até o limite do valor do patrimônio transferido, podem ser atingidos, MAS A PENA PESSOAL QUE FOR IMPOSTA AO SUCEDIDO NÃO PODE SER TRANSFERIDA AOS SUCESSORES.

A interpretação da digna assessoria técnico jurídica (ATJ) do Egrégio Tribunal de Contas do Estado, ao declarar, citando reconhecido e brilhante jurista, que a recuperação de empresas pelo desmembramento de seu acervo e constituição de nova empresa, embora louvável, não pode servir para lavagem de dinheiro, não só é contrária aos fatos da subsidiária integral, CRIADA POR DETERMINAÇÃO JUDICIAL, após concordância da Assembléia de credores, como, em nenhum momento, nas licitações em que concorreu e ganhou, tal matéria foi levantada. Ao contrário, como seus preços eram mais baixos que os das suas concorrentes, nenhuma suspeita poderia ser-lhe lançada. Os preços mais elevados dos concorrentes é que deveriam levantar suspeitas 18.

Por outro lado, claramente, a criação da subsidiária integral, no caso concreto, foi exclusivamente para atuar NA MESMA ÁREA da empresa em recuperação, o que, se válida a tese do digno assessor jurídico do Colendo Tribunal de Contas, representaria a criação de uma empresa inútil, pois estaria impossibilitada de atuar para a geração de recursos, em face da transferência DA PENA VEDATÓRIA IMPOSTA À EMPRESA EM RECUPERAÇÃO PARA A ENTIDADE CRIADA PARA GERAR RECURSOS.

No caso, não há de se confundir a pena de inidoneidade, aplicada à empresa recuperanda –e só a ela—, com penas de natureza pecuniária, que podem ser transferidas a terceiros, em algumas hipóteses sucessórias. A inidoneidade é de quem pratica o ato, pena pessoal aplicável à pessoa física ou jurídica, e é intransferível.

Para isto, entende-se que o princípio do inciso XLV do art. 5º, da CF, explicitamente cuidando de pessoas físicas, é implicitamente aplicável às pessoas jurídicas, como decorrencial do sistema 19.

Não há, pois, possibilidade de se pretender a transferência de declaração de idoneidade de uma empresa para outra, por força de todos os elementos reiterados neste parecer e da clareza do art. 5º inciso XLV da CF, que, embora endereçado para pessoas físicas, gera, de rigor, princípio extensível a pessoas jurídicas.

Nem há que se falar do princípio da moralidade, do art. 37 da CF, princípio geral a ser interpretado nos termos da CF, ou do art. 422 do Código Civil, visto que, no caso concreto aqui examinado, as autoridades declararam vencedor, na principal licitação, o consórcio do qual participa a subsidiária criada judicialmente, porque ofertou preço menor que seus concorrentes, com indiscutível benefício para os cofres do Estado 20. Em termos diversos, a pretendida desclassificação imporia um ônus superior ao Estado, em face do concorrente que ficou em 2º lugar apresentar proposta consideravelmente superior em valores. Decididamente, tal acréscimo de preço não É DO INTERESSE PÚBLICO.

Uma consideração a mais se faz necessária. Diz respeito à desconsideração da personalidade jurídica ou do ato formal distintivo da realidade.

No Brasil, a discussão sobre a matéria faz-se principalmente em duas grandes vertentes, ou seja, a teoria extensiva e a teoria limitativa.

Pela primeira, sempre que os atos praticados, por intermédio da pessoa jurídica, refugirem aos limites de sua personificação, tais atos não seriam inválidos, mas ineficazes para aquela forma, embora ganhando eficácia atributiva de outra conformação jurídica. O superamento da pessoa jurídica decorreria de sua inadequação, ao receber a forma pretendida pelas partes, forma esta incapaz de tirar a validade jurídica do negócio acordado, mas recebendo, tais atos jurídicos, outro tratamento jurisprudencial ou legislativo 21.

Pela teoria limitativa, a desconsideração deveria decorrer, necessariamente, de formulação jurisprudencial, visto que a previsão legal da hipótese desconsiderativa já representaria tratamento legislativo pertinente. Por essa razão, não hospedaria a teoria da desconsideração, mas apenas uma singela teoria de imputação dos efeitos legais aos atos normados 22.

As duas correntes possuem, no Brasil, adeptos de escol, quase sempre, em sua versão privativista, ou seja, naquela em que a lacuna legal é preenchida pelo fenômeno imperativo ou a previsão legal já lhe dá tratamento pertinente 23.

O aspecto de interesse, todavia, é que a desconsideração da personalidade jurídica prevê a utilização da personificação de forma inadequada. Os atos são praticados pela sociedade, mas nela não têm os reflexos pretendidos, embora válidos, pois superam a conformação legal de suas virtualidades.

Ora, no caso concreto, não há como pretender tenha havido a adoção de forma para esconder o fato real, na medida EM QUE TODOS OS ELEMENTOS DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL ERAM DE PLENO CONHECIMENTO e a empresa “b” SÓ FOI CRIADA DEPOIS DE VARIADOS ESTUDOS SOBRE SUA VIABILIDADE, MEDIANTE AUTORIZAÇÃO DE CREDORES E DO JUIZ. Só o amplo desconhecimento da teoria superativa pode levar alguém a considerar a criação da empresa “b”, como passível de ser enquadrada na hipótese desconsiderativa, em que se esconde a realidade pela adoção de forma apenas aparentemente jurídica 24.

À evidência, não há como pretender-se aplicar a “disregard doctrine” na criação da empresa “b”, objetivando gerar recursos para a recuperação da “Empresa “a””, com decidida e necessária participação judicial.

Uma outra breve consideração: pelo artigo 5º, inciso LV, da CF, a ampla defesa administrativa é assegurada em todo o processo administrativo, sendo a densidade do adjetivo ampla a prova inequívoca de que o direito de defesa passou a ser, no Estado Democrático brasileiro, um de seus esteios. Não de qualquer defesa administrativa ou judicial falou o constituinte, mas da ampla defesa. Assim, se aplicável fosse, que não é, à empresa consulente, qualquer pena, tal aplicação não poderia ocorrer SEM QUE LHE FOSSE ASSEGURADA A AMPLA DEFESA. Apenas, nas ditaduras, o contraditório não é assegurado e a defesa reduzida a sua expressão nenhuma. Não é o caso do Brasil e de sua “Constituição Cidadã”, no dizer de Ulisses Guimarães.



Neste sentido, é pacífica a jurisprudência, principalmente nos casos de inidoneidade declarada:

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem reafirmado a essencialidade desse princípio, nele reconhecendo uma insuprimível garantia, que, instituída em favor de qualquer pessoa ou entidade, rege e condiciona o exercício, pelo Poder Público, de sua atividade, ainda que em sede materialmente administrativa, sob pena de nulidade do próprio ato punitivo ou da medida restritiva de direitos. Precedentes. Doutrina.”(RTJ 183/371-372, Rel. Min. CELSO DE MELLO) Isso significa, pois, que assiste, a qualquer interessado, mesmo em procedimentos de índole administrativa, como direta emanação da própria garantia constitucional do “due process of law” (independentemente, portanto, de haver, ou não,previsão normativa nos estatutos que regem a atuação dos órgãos do Estado), a prerrogativa indisponível do contraditório e da plenitude de defesa, com os meios e recursos a ela inerentes, consoante prescreve a Constituição da República, em seu art. 5º,incisos LIV e LV. Vale referir, neste ponto, importante decisão emanada do Plenário do Supremo Tribunal Federal que bem exprime essa concepção em torno da garantia constitucional do “due process of law”: “(...) 3. Direito de defesa ampliado com a Constituição de 1988. Âmbito de proteção que contempla todos os processos, judiciais ou administrativos, e não se resume a um simples direito de manifestação no processo. 4. Direito constitucional comparado. Pretensão à tutela jurídica que envolve não só o direito de manifestação e de informação, mas também o direito de ver seus argumentos contemplados pelo órgão julgador. 5. Os princípios do contraditório e da ampla defesa, assegurados pela Constituição, aplicam-se a todos os procedimentos administrativos. 6. O exercício pleno do contraditório não se limita à garantia de alegação oportuna e eficaz a respeito de fatos, mas implica a possibilidade de ser ouvido também em matéria jurídica.(...) 10. Mandado de Segurança deferido para determinar observância do princípio do contraditório e da ampla defesa (CF, art. 5º, LV).”(RTJ 191/922, Rel. p/ o acórdão Min. GILMAR MENDES - grifei) Embora em juízo de estrita delibação, parece-me que essa fundamental prerrogativa legitimadora do exercício do contraditório teria sido inobservada no caso ora em exame, notadamente se se considerar o que dispõe, a respeito, o art. 87, § 3º,da Lei nº 8.666/93. A eminente autoridade apontada como coatora, ao declarar a inidoneidade da parte impetrante para licitar e/ou contratar com a União, parece haver descumprido a cláusula constitucional que assegura o direito ao contraditório, especialmente em casos, como o de que ora se cuida, em que o procedimento administrativo tenha sido instaurado com o objetivo de aplicar sanção restritiva de direitos. Tal situação evidenciaria, ao menos em juízo de sumária cognição, a plausibilidade jurídica da pretensão cautelar ora em exame (MS 13.101/DF, Rel. p/ o acórdão Min. ELIANA CALMON): “ADMINISTRATIVO - MANDADO DE SEGURANÇA. - Declaração de inidoneidade. Sanção administrativa que é, a sua aplicação, sem oportunidade de defesa, conduz à nulidade do ato. - Recurso provido.” (RMS 245/PR, Rel. Min. AMÉRICO LUZ - grifei). “PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. OPORTUNIZAÇÃO DE DEFESA. DECLARAÇÃO DE INIDONEIDADE DA EMPRESA LICITANTE. ART. 87, INCISO IV E § 3º, DA LEI N.º 8.666/93. LIMINAR. 'PERICULUM IN MORA' E 'FUMUS BONI JURIS' DEMONSTRADOS. ....................................................... 4. 'Fumus boni juris' que, 'prima facie', encontra-se evidenciado porquanto violado o disposto no art. 87, § 3º, da Lei n.º 8.666/93 ('§ 3º. A sanção estabelecida no inciso IV deste artigo é de competência exclusiva do Ministro de Estado, do Secretário Estadual ou Municipal, conforme o caso, facultada a defesa do interessado no respectivo processo, no prazo de 10 (dez) dias da abertura de vista, podendo a reabilitação ser requerida após 2 (dois) anos de sua aplicação)', a demonstrar a liquidez e certeza do direito alegado. 5. O 'periculum in mora', por sua vez, ressoa evidente na proibição de licitar e contratar com a Administração Pública resultante da declaração de inidoneidade pelo Ministro de Estado da Agricultura. 6. Agravo regimental desprovido para manter a decisão que concedeu a liminar para suspender os efeitos da decisão do Ministro de Estado que declarou a inidoneidade da empresa impetrante para fins de oportunizar a sua defesa no Processo Administrativo n.º (MS 15.267 – AgRg - RCDESP/DF, Rel. Min. LUIZ FUX – grifei. Esse entendimento jurisprudencial, por sua vez, tem o beneplácito do magistério doutrinário (LUIS CARLOS ALCOFORADO, “Licitação e Contrato Administrativo”, p. 419, 2ª ed., 2000, Brasília Jurídica; FERNANDA MARINELA, “Direito Administrativo”,p. 467/468, 5ª ed., item n. 13, 2011, Impetus; HELY LOPES MEIRELLES, “Licitação e Contrato Administrativo”, p. 337, item n. 3.4, 15ª ed., 2010, Malheiros; MARÇAL JUSTEN FILHO, “Curso de Direito Administrativo”, p. 557, item n. VIII.31.8, 5ª ed., 2010,Saraiva; LUCAS ROCHA FURTADO, “Curso de Direito Administrativo”, p. 368, item n. 6.9.4, 2007, Fórum; MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO, “Direito Administrativo”, p. 272/273, item n. 8.6.7.5, 22ª ed., 2009, Atlas, v.g.), cabendo referir o ensinamento de RONNY CHARLES LOPES DE TORRES (“Leis de Licitações Públicas Comentadas”, p. 328, 2ª ed., item n. 882, 2009, JusPODIVM), que expende, sobre o tema, precisa lição: “Mesmo que já tenha o interessado se defendido em eventual processo sobre aplicação de pena de suspensão, decorrente do mesmo contrato, deve ser dada nova oportunidade de defesa, inclusive com pedido de produção de novas provas, perante a nova autoridade julgadora.” (grifei) Sendo assim, e sem prejuízo de reexame da matéria em momento oportuno, suspendo, cautelarmente, até final julgamento desta ação mandamental, a eficácia da Portaria PGR nº 495, de 13 de setembro de 2011, emanada do eminente Procurador-Geral da República, para afastar a aplicação da “penalidade administrativa de inidoneidade para licitar e contratar com a União” imposta à parte ora impetrante. Comunique-se, com urgência, transmitindo-se cópia da presente decisão ao eminente Procurador-Geral da República. Dê-se ciência desta decisão ao eminente Senhor Advogado-Geral da União (Lei nº 12.016/2009, art. 7º, II). Publique-se. Brasília, 30 de abril de 2012. Ministro CELSO DE MELLO Relator” (grifos meus) 25.

Dois últimos aspectos devem, ainda ser considerados.

O primeiro diz respeito aos exaustivos estudos realizados para que o Poder Judiciário se decidisse a criar empresa “b”, com apoio dos credores da Empresa “a”.

Não se pode, pois, contestar não só a viabilidade da solução adotada, como a sólida e correta fundamentação da decisão judicial, apoiada na concordância dos credores da empresa em recuperação.

O segundo aspecto diz respeito, no caso do Consórcio, do qual a empresa “b” é participante, QUE A SUA PROPOSTA VENCEDORA, numa das licitações É UM BILHÃO DE REAIS menos onerosa que a do 2º concorrente, em clara demonstração de que se viesse a ser anulada para beneficiar orçamento de um bilhão de reais superior, estariam sendo afetadas as finanças do Estado em consideráveis valores 26.

Ora, um dos princípios de maior relevância, dos cinco princípios próprios da Administração Pública, é o da eficiência, estando o “caput” do artigo 37 da CF, que repito, assim redigido:



Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)” (grifos meus) 27.

Tenho para mim, inclusive, que feriria os princípios da eficiência e moralidade, que proposta de concorrente, tão desproporcionada em valores, fosse aceita mediante a desqualificação da consulente, por amputadora e inaceitável interpretação da lei de recuperação judicial.

Para que se tenha noção do que significa um bilhão de reais, é de se lembrar que um bilhão de segundos levaria 31 anos e meio para se escoarem, segundo informou-me o saudoso confrade Clodowaldo Pavan, na Academia Paulista de Letras, ao tempo da minha presidência.

Como se percebe, a tentativa de eliminar concorrente que, provando competência técnica, propôs orçamento de um bilhão de reais mais favorável ao Estado torna, pelo menos suspeita, a tentativa de desclassificação do consulente, à luz da mutiladora interpretação da lei de recuperação judicial de empresas em dificuldades financeiras 28.

Isto posto, passo a responder às diversas questões formuladas de forma sintética.

1) É legitima a operação de criação de subsidiária integral como mecanismo de processo de recuperação judicial, tal qual estabelece o inciso II do artigo 50 da Lei Federal nº 11.101/05? Em caso positivo, quais os objetivos e finalidades elementares da medida?

Sim. Como mostrado no bojo deste parecer, o artigo 47 da Lei 11.101/93 declara as finalidades da lei e o artigo 50 elenca os instrumentos modernos de recuperação, inclusive o da criação de subsidiária integral. Seu objetivo maior é gerar recursos, sem as amarras da empresa em recuperação, para que se adquiram condições de saldar seus compromissos em atraso, nos prazos e condições, acordados e estabelecidos em juízo.



2) É correta a equiparação entre a operação de criação de subsidiária integral no bojo de processo de recuperação judicial com a chamada alienação de estabelecimento (sucessão empresarial), tal qual regulado pelos artigos 1.144 e seguintes do Código Civil? É possível afirmar que houve "sucessão empresarial" entre Empresa “a” e empresa “b”?

Não se aplica à empresa constituída nos termos da lei especial (nº 11.101/05), as normas da lei geral (Código Civil, arts. 1145 e seguintes), pois a sucessão empresarial, nos termos da legislação civil, em nível de responsabilidades pretéritas, não atinge a nova, sob pena de torná-la rigorosamente inútil. A suspensão ou eliminação das amarras que tolhem a empresa em recuperação judicial devem seguir o rito do estabelecido em juízo e na Assembléia Geral dos credores, nos termos da lei especial. O relevante, na sua criação, é deixá-la livre, sem pendências, para que recursos viabilizem a recuperação da empresa em dificuldades financeiras 29.

É de se lembrar, todavia, que o artigo 1145 faz menção clara à concordância dos credores, o que, na hipótese, ocorreu.

3) É possível que uma sanção administrativa aplicada a uma empresa seja estendida à outra, que figura como sua subsidiária integral? No caso narrado, a sanção de declaração de inidoneidade aplicada à empresa Empresa “a” pode ser estendida à empresa “b”, sua subsidiária integral?

Como mostrei no corpo deste parecer, pelo inciso XLV do art. 5º da lei suprema, não se transfere pena (inidoneidade) de uma empresa para outra, como pela própria lei de recuperação tal transferência não se faz. Embora o mencionado inciso XLV esteja explicitamente voltado às pessoas físicas, o princípio nele inscrito é implicitamente aplicável às pessoas jurídicas. É bom relembrar que, se a declaração de inidoneidade de uma empresa fosse levada à outra, criada com o intuito de recuperá-la, A CRIAÇÃO DESTA EMPRESA SERIA INÓCUA E DISPENDIOSA, em prejuízo de todos os credores!!! A declaração de inidoneidade da empresa em recuperação não se estende à empresa decorrencial, criada por determinação judicial, objetivando tornar viável a referida recuperação 30.



4) Qual o papel, no caso, do inciso XLV do artigo 5º da Constituição Federal? Nesse sentido, é juridicamente viável a pretensão de transferência à empresa “b” da sanção aplicada à sua controladora?

Como já exposto na questão anterior, não há a transferência da declaração de inidoneidade de uma empresa para a outra, em processo de recuperação judicial ou mesmo fora dele, por força do art. 5º inciso XLV da CF 31.



5) É juridicamente possível o sancionamento administrativo de um particular sem respectivo ato administrativo, impondo de forma fundamentada a penalidade? E sem processo administrativo sancionatório especificamente instaurado, com as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa?

Como exposto no corpo do parecer e na carta preambular entregue à Consulente, o art. 5º, inciso LV, da lei suprema impõe a AMPLA - repito, AMPLA - defesa administrativa e o contraditório, não sendo, pois, viável a extensão de penalidade administrativa de uma empresa para outra, principalmente quando esta foi criada sem as amarras daquela da qual se originou, POR DETERMINAÇÃO JUDICIAL e CONCORDÂNCIA DOS CREDORES. TEM A CONSULENTE O DIREITO À AMPLA DEFESA e ao contraditório. A resposta é, portanto, negativa 32, seja quanto à possibilidade de se prescindir da observância do direito à ampla defesa, seja no concernente a prescindir da motivação do ato administrativo. A ausência desse requisito, a teor do art. 93, X, da CF, torna-o nulo 33.



6) Quais seriam os requisitos para a aplicação da teoria da desconstituição de personalidade jurídica? No caso narrado, encontram-se presentes tais requisitos? É possível falar, no caso em tela, em "abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial"? É possível a desconstituição da personalidade jurídica em sede administrativa, sem a instauração de processo administrativo específico?

No caso, à evidência, não é possível a aplicação da teoria superativa. Esta pressupõe adotar-se forma jurídica distinta da realidade do ato, buscando-se esconder a real pretensão do autor. A descoberta da manipulação formal gera a desconstituição. Ora, nada foi escondido, tudo foi examinado às claras por todos os que estavam envolvidos no processo de recuperação, com a criação de empresa, por determinação judicial, para auxiliar a recuperação da empresa da qual resultou.

Nitidamente, na espécie não ocorreu nenhum dos requisitos necessários à aplicação da teoria superativa. Não houve abuso de qualquer espécie, nem desvio de finalidade, MAS RIGOROSO CUMPRIMENTO DA LEI 11.101/05, após minucioso exame judicial pelo magistrado, que determinou a criação da subsidiária integral, com concordância dos credores.

7) O resultado da licitação que sagrou vencedor o Consórcio, integrado pela empresa “b”, cuja proposta apresenta preço aproximadamente um bilhão de reais mais baixo que a do segundo colocado, foi vantajosa para o governo do estado?

A diferença de proposta entre o 1º e o 2º colocados na licitação a favor da consulente demonstra o quão acertada foi a decisão do governo do Estado em optar por uma e não por outra. Um princípio constitucional justifica tal opção (o princípio da eficiência), sendo, pois, suspeito que, diante de tal discrepância de valores, ainda se pretenda anular a concorrência para onerar o Estado em um bilhão de reais, se a opção for pelo 2º colocado. Se algo merecia ser investigado é se o princípio da moralidade não foi maculado nesta tentativa de desclassificação de uma empresa, para a acolhida de proposta nitidamente muito mais onerosa às finanças do Estado 34.

É o parecer,

S.M.J.


São Paulo, 19 de Novembro de 2013.



1 É de se lembrar que o anteprojeto do Ministério da Justiça levado ao Congresso teve decidida colaboração do IASP Instituto dos Advogados de São Paulo, entidade que presidi em 1985/86, conforme escreve Rubens Approbato Machado: “Em razão da proposta do IASP, o anteprojeto do Ministério da Justiça sofreu substanciais alterações, que acabou se transformando em Projeto de Lei, de iniciativa do Poder Executivo, e que foi encaminhado à Câmara Federal, resultando no PROJETO DE LEI 4.376, DE 1993” (Comentários à nova lei de falências e recuperação de empresas – Doutrina e prática, 2ª. Ed., Ed. Quartier Latin, São Paulo, 2007, p. 24).

2 Lídia Valério Marzagão esclarece: “Neste diapasão, a nova Lei, de forma positiva, e após ampla discussão com os diversos segmentos da sociedade brasileira, delineia algumas formas de recuperação, trazendo uma relação não exaustiva, de meios que o devedor poderá se utilizar para organizar um plano de rees­truturação da empresa.

Além desses meios apresentados pelo legislador, o devedor poderá apresentar outros com características e formas diferenciadas que melhor atendam suas necessidades, uma vez que o legislador deixa ao livre-arbí­trio do devedor expor a forma pela qual ele pretende sair da crise. Exige, no entanto, que o plano de recuperação projetado esteja conveniente­mente adequado às condições econômicas e sociais da empresa e que permita a continuidade das atividades empresariais. Ele deverá demons­trar a importância do objeto social no meio em que se encontra e sua capacidade de honrar os compromissos, demonstrando possibilidades de reerguer a empresa que atravessa uma crise de liquidez temporária” (Comentários à nova lei de falências e recuperação de empresas, ob. Cit. p. 102).


3 Donald Mc Nicole e Murched Badih Sanna ensinam: “O Plano de Recuperação pode incluir a previsão de liberação de edifícios e equipamentos. Esses itens do ativo da empresa podem estar fora de uso no momento da preparação do plano de recuperação ou vierem a ser liberados como parte das providências previstas no plano” (Comentários à nova lei de falências e recuperação de empresas, ob. Cit., p. 186).


4 Maria Odete Bertassi , ex-presidente do IASP, lembra que neste processo de escolha dos meios há a participação dos credores, além da escolha de administrador judicial: “Anteriormente, a escolha do ocupante do cargo re­caía, primeiramente, sobre os credores. Somente após a reiterada recusa credores previamente definidos na legislação falimentar é que seria possível a indicação dos dativos. Agora, de acordo com a nova lei, a escolha recairá, desde logo, sobre um rol de profissionais já preferencialmente listado pelo legislador, ou sobre empresa especializada.
O administrador judicial, diferentemente das extintas figuras do comissário e do síndico, tem suas atividades fiscalizadas pelo Comitê de Credores.
Além disso, houve substancial ampliação de atribuições, na medida em que ao administrador judicial compete fiscalizar as atividades do devedor e o cumprimento do plano de recuperação judicial, sobre cuja execução deverá, ainda, apresentar relatório ao juízo” (Comentários à nova lei de falências e recuperação de empresas, ob. Cit. p. 163).


5 Ensina Mário Sérgio Milani que: “Ricardo Tepedino sustenta: "O inciso II do art. 50 inclui a "constituição de subsidiária integral” como um dos meios de recuperação ao referir-se à constituição de subsidiária integral como meio de recuperação judicial, quis o legislador com toda a certeza aludir a uma operação societária atípica: o chamado “drop down”, onde a subsidiária integral é constituída com a finalidade de receber o estabelecimento empresarial da sociedade que a cria” (Lei de recuperação judicial, recuperação extrajudicial e falência comentada, Malheiros Editores, São Paulo, 2011, p. 221).


6 É de se lembrar em caso de não criação de empresa nova geradora de recursos, mas de mera alienação, o comprador estará livre de qualquer obrigação (art. 60). Leia-se em Curso de falência e recuperação de empresa” (27ª. Ed., Ed. Saraiva, São Paulo, p. 340) de Amador Paes de Almeida que: “Em capítulo próprio, o art. 50, ao estabelecer os meios de recuperação judicial, prevê situações que, inequivocamente, alteram de maneira substancial a estrutura jurídica da empresa, merecendo destaque, entre outros, o trespasse do estabelecimento empresarial, alienação judicial de filiais ou de unidades produtivas isoladas (art. 60).

Objetivando facilitar os meios de recuperação judicial, buscou o legislador afastar o bem de ônus ou sucessão, dispondo o parágrafo único do art. 60 que: "O objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor, inclusive as de natureza tributária, observado o disposto no § 1º do art. 141 desta Lei”.



7 Fábio Diniz Appendino escreve: “O plano de recuperação judicial é o documento pelo qual o devedor demonstrará, aos credores, pormenorizadamente, (i) a viabilidade econômica do empreendimento; (ii) o valor de mercado de seus ativos e (iii) a forma pela qual pretende recuperar a empresa e equacionar seus passivos. Ele deverá discriminar, detalhadamente, os meios de recuperação que serão levados a cabo, podendo, o devedor, fazer uso daqueles indicados no artigo 50 da lei falimentar como de outros quaisquer (o rol legal não é taxativo) que atendam ao objetivo da lei: a recuperação da empresa” (Direito Societário e a nova lei de falências e recuperação de empresas, Ed. Quartier Latin, São Paulo, 2006, p. 338).


8 Leia-se: “Recuperação judicial. Conceito. TJGO: "Na lição do Deputado Federal Osvaldo Biolchi, relator do Projeto de Lei que culminou com a instituição da Lei de Falências (n° 11.101/05), juntamente com outros autores renomados, informam: "Recuperação judi cial é o instituto jurídico, fundado na ética da solidariedade, que visa sanear o estado de crise econômico-financeira do empresário e da sociedade empresária com a finalidade de preservar os negócios sociais e estimular a atividade empresarial, garantir a continuidade do emprego e fomentar o trabalho humano, assegurar a satisfação, ainda que parcial e em diferentes condições, dos direitos e interesses dos credores e impulsionar a economia cre ditícia, mediante a apresentação, nos autos da ação de recuperação judicial, de um plano de reestruturação e reerguimento, o qual, aprovado pelos credores, expressa ou tacitamente, e homologado pelo juízo, implica novação dos créditos anteriores ao ajuizamento da deman­da e obriga a todos os credores a ela sujeitos, inclusive os ausentes, ou dissidentes e os que se abstiveram de participar das deliberações da assembléia geral”. (In Comentários à Lei de Recuperação de Empresas e Falência, Ed, Saraiva, São Paulo: 2005, ps. 104/l05)"(AI n. 61731-2/180(200800650683), rel. Des. Jair Xavier Ferro, j. 8.5.2008)” (Lei de falências e de recuperação de empresas e sua interpretação jurisprudencial, Cristiano Imhof, Conceito Editorial, 2009, p. 151).


9 O artigo 53 da Lei nº 11.101/05 tem a seguinte dicção:

Art. 53. O plano de recuperação será apresentado pelo devedor em juízo no prazo improrrogável de 60 (sessenta) dias da publicação da decisão que deferir o processamento da recuperação judicial, sob pena de convolação em falência, e deverá conter:

        I – discriminação pormenorizada dos meios de recuperação a ser empregados, conforme o art. 50 desta Lei, e seu resumo;

        II – demonstração de sua viabilidade econômica; e

        III – laudo econômico-financeiro e de avaliação dos bens e ativos do devedor, subscrito por profissional legalmente habilitado ou empresa especializada.

        Parágrafo único. O juiz ordenará a publicação de edital contendo aviso aos credores sobre o recebimento do plano de recuperação e fixando o prazo para a manifestação de eventuais objeções, observado o art. 55 desta Lei”.



10 Leia-se: “Recuperação judicial. Finalidade. TJRT: "A recuperação judicial tem como finalidade precípua o soerguimento da empresa median­te o cumprimento do plano de recuperação, salvaguardando a atividade econômica e os empregos que ela gera, além de garantir, em última "ratio", a satisfação dos credores" (AI n. 2008.002.21326, rel. Des. Celso Ferreira Filho, j. 11.11.2008); TJSC: "Segundo Már­cio Luiz Aguiar: [....] para ser recuperável, uma empresa precisa dar sinais de solvência, ser economicamente viável e lucrativa, compensar os esforços dos credores (de maneira a remu­nerá-los pelo menos em montante razoável, como haveria de ser com a liquidação), afirmar a sua função social e a importância da manutenção dos postos de trabalho que gera, além de congregar positivamente todos os interesses envolvidos na reversão de seu quadro defici­tário. (in Empresa, Recuperação e Liquidação na nova Lei de Falência, Florianópolis: Habitus Editora, 2006, p. 140)" (AI n. 2007.039664-1, rel. Des. Lédio Rosa de Andrade, j. 6.5.2007)” (Lei de falências e de recuperação de empresas e sua interpretação jurisprudencial, Cristiano Imhof, Conceito Editorial, 2009, p. 151).


11 Leia-se: 'TJSP: "A recuperação judicial tem por objeti­vo viabilizar que o devedor supere a situação de crise financeira e preserve os interesses dos credores da empresa recuperanda, afigurando-se inviável a conciliação da implementação do plano de recuperação e o prosseguimento de execuções isoladas. MANOEL JUSTINO BEZERRA FILHO, em sua obra “Lei de Recuperação de Empresas e Falências Comentada”, 4ª edição, página 46, anota que a recuperação de empresas, apesar de se tratar de um procedi­mento judicial, ainda assim tem um substrato de caráter marcadamente econômico, mais que jurídico. Podemos confirmar o dito acima com a simples leitura do art. 47 da Lei de falências, que dispõe “A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica” (AI nº 7277163-2, rel. Des. Roque Mesquita, j. 24/11/2008)” (grifos meus) (Lei de falências e de recuperação de empresas e sua interpretação jurisprudencial, Cristiano Imhof, Conceito Editorial, 2009, p. 151/2).


12 Comentei-o: “A clareza dos dispositivos oferta pouca margem de dúvidas sobre a intenção legislativa, sobre o sistema hospedado para questões exegéticas — dedicado ao intérprete — e sobre a racionalidade dos princípios que regem a lei positiva no tempo.

Em junho de 1979,quando fomos convidados a proferir palestra em Belo Horizonte e, simultaneamente, servir de debatedor na conferência do Professor Haroldo Valadão, um dos responsáveis pelo D.L 4.657/42—no mesmo dia, tendo ele servido de nosso debatedor—, discutíamos no intervalo entre ambas — e durante o almoço— a perenidade da Lei de Introdução ao Código Civil, pela excelência de seus dispositivos, tendo o eminente jurista se referido ao art. 2º como daqueles mais estáveis no ordenamento jurídico nacional.

De rigor, o art. 2º permite ao intérprete a adoção dos critérios maiores para conhecimento da permanência normativa.

Assim é que a cabeça do artigo delimita o aspecto temporal, informando que uma lei vigora até que seja revogada ou modificada por outra.

Se se pode discutir a eventual redundância dos verbos utilizados “modificar” e revogar”, posto que a explicação do § 1º demonstra que a revogação, por sua extensão vernacular, abrange qualquer forma de afastamento do direito anterior, inclusive a derrogação, ou seja, a alteração parcial, tal redundância, em se a admitindo, já que há autores que defendem a explicitação —, não prejudica a clareza do comando legislativo, o qual esclarece que em algumas hipóteses ocorre a revogação, a saber: de forma expressa, pela incompatibilidade das disposições, prevalecendo a nova conformação legislativa, e pela inteira regulação da lei anterior.

As três hipóteses, portanto, estalajam as gamas possíveis de modificação total ou parcial (abrogação ou derrogação), ressaltando-se a importância do § 2º que retira abrangência das duas hipóteses finais do § 1º (incompatibilidade e regulação completa) e do § 3º que evita a repristinação.

Ora, o § 2º explicita a possibilidade convivencial de normas não conflitantes que se coloquem em regência paralela, vigendo lei nova e lei pretérita seja no concernente às disposições gerais, seja no concernente às disposições especiais” (grifos não constantes do texto) (Direito Econômico e Empresarial, Ed. Cejup, 1986, Belém-Pará, p. 60/61).



13 Nelson e Rosa Nery sobre a doutrina a respeito do artigo 2º da Lei de Introdução ao Código Civil escreveram: “Doutrina – Monografias: Hugo Resende Subiabre — La promulgación y la publicación de la ley, 1941; Jean Jacques de Pury — De la publication des bis, 1945; Manuel Gonçalves Ferreira Filho —Do processo legislativo, 3 .“ ed., 1995; Luis Maria Diez-Picazo — La derogacion de las leyes, 1990; Márcia Maria Corrêa de Azevedo —Prática do processo legislativo —jogo parlamentar (fluxos de poder e idéias no Congresso), 2001; Nelson de Sousa Sampaio — O processo legislativo, 2. ed., 1996.

Artigos: Ives Gandra da Silva Martins — A convivência da lei especial, Dec. 99182/90. inteligência do art. 2.° da Lei de Introdução ao CC, o princípio da seletividade no IPI, exegese do art. 41 das disposições transitórias da CF (JTACivSP 126; RT 670/28); Mauro de Medeiros Keller - Pontes de Miranda e os fundamentos do princípio da irretroatividade (RDC 50/66); Sílvia Soares de Mello do Val -A aplicação de lei nova aos contratos de locação em curso (RDC 53/211)” (grifos meus) (Código Civil Anotado e legislação extravagante, Ed. Revista dos Tribunais, 2ª. ed., Ed. Revista dos Tribunais, 2003, p. 106/7).



14 Marcos Paulo de Almeida Salles e Alberto Gosson Jorge Jr. lembram que:

Neste momento, a análise das figuras elencadas no inciso II do art. 50 da Lei de Falências, que inclui as incorporações, fusões e cisões, passa a ser feita em base a que sua utilização se veja reforçada pela expressa viabilidade recuperatória. Isso nos permite entender que o le­gislador, quando incluiu estas figuras junto com aquelas demais que as acompanham no inciso II

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