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Enfrentando nossos limites: Educação popular e escola pública


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Teorias mediacionais


Durante o presente século, e como reações à interpretação behaviorista da aprendizagem, surgem, se desenvolvem e se transformam diversas teorias psicológicas que englobamos na corrente cognitiva. Apesar de importantes e significativas diferenças entre elas, as agruparemos num conjunto por coincidirem em alguns pontos fundamentais:

  • A importância das variáveis internas.

  • A consideração da conduta como totalidade.

  • A supremacia da aprendizagem significativa que supõe reorganização cognitiva e atividade interna.

Derivações da corrente da Gestalt ou teoria do campo

Wertheimer, Kofka, Kholer Wheeler e Lewin são os principais representantes da interpretação gestaltista da aprendizagem. Supõem uma reação contra a orientação mecânica e atomista do associacionismo condutista. Consideram que a conduta é uma totalidade organizada. A compreensão parcelada e fracionária da realidade deforma e distorce a significação do conjunto. O todo   os fenômenos de aprendizagem e conduta   é algo mais do que a soma e justaposição linear das partes. Tão importante ou mais do que entender os elementos isolados da conduta é a compreensão das relações de codeterminação que se estabelecem entre os mesmos de formar uma totalidade significativa. As forças que rodeiam os objetos, as relações que os ligam entre si, definem realmente suas propriedades funcionais, seu comportamento.

Apoiando-se nestes pressupostos, chegam assim a definir o conceito de campo (transferência do âmbito da física para o terreno da psicologia) como o mundo psicológico total em que opera a pessoa num determinado momento. É este conjunto de forças que interage ao redor do indivíduo o responsável pelos processos de aprendizagem. Consideram a aprendizagem como um processo de doação de sentido, de significado, às situações em que o indivíduo se encontra. Sob as manifestações observáveis se desenvolvem processos de discernimento e de busca intencional de objetivos e metas. O indivíduo não reage de forma cega e automática aos estímulos e pressões do meio objetivo, reage à realidade tal como a percebe subjetivamente. Sua conduta responde à sua compreensão das situações, ao significado que confere aos estímulos que configuram seu campo vital em cada momento concreto.

É necessário ressaltar a extraordinária riqueza didática que se aloja na teoria do campo. A interpretação holística e sistêmica da conduta e a consideração das variáveis internas como portadores de significação são de um valor inestimável para a regulação didática da aprendizagem humana na escola. Por outro lado, as leis da aprendizagem nesta teoria, ainda que sejam mais difusas e imprecisas, permitem uma explicação dos tipos mais complexos e superiores de aprendizagem. Os tipos de aprendizagem representacional, de conceitos, de princípios, de solução de problemas exigem a intervenção como mediadores das estruturas cognitivas que implicam operações cujo denominador comum é a compreensão significativa das situações.

Além disso, a importância que as teorias do campo concedem ao significado como eixo e motor de toda aprendizagem supõe a primazia da motivação intrínseca, da aprendizagem desejada, auto-iniciada, apoiada no interesse por resolver um problema, por estender a clareza e o significado a parcelas cada vez mais amplas do espaço vital, do território onde o indivíduo vive, onde satisfaz suas múltiplas e diversas necessidades. A motivação emerge das solicitações e exigências da própria existência, da necessidade de aprendizagem para compreender e agir racionalmente na troca adaptativa com o meio sócio-histórico e natural. A aprendizagem transforma-se num instrumento de desenvolvimento do aperfeiçoamento das capacidades intelectuais e da sobrevivência que permitem a expansão criadora da vida individual e coletiva.

A organização didática do ensino deverá levar em conta esta dimensão global e subjetiva dos fenômenos de aprendizagem. É todo um espaço vital do sujeito que se põe em jogo em cada momento. Não é um problema de mais ou menos conhecimentos, da quantidade de informação acumulada na reserva do indivíduo. Trata-se da orientação qualitativa de seu desenvolvimento, do aperfeiçoamento de seus instrumentos de adaptação e intervenção criativa, da clarificação e conscientização das forças e fatores que configuram seu específico espaço vital.

Apesar da riqueza didática destas posições, em minha opinião é imprescindível assinalar os pontos fracos que exigem um desenvolvimento mais satisfatório:


  • Em primeiro lugar, existe um certo descuido da verificação empírica das hipóteses tão ricas e fecundas que entranham as teorias do campo. O desenvolvimento da especulação, de constructos hipotéticos e esquemas formais exige o complemento de uma rigorosa comprovação empírica de seus pontos mais significativos e de suas hipóteses mais aventuradas, se requer a busca de evidências em que apoiar tão sugestivas colocações.

  • Em segundo lugar, parece arriscado estabelecer um rigoroso isomorfismo entre percepção e aprendizagem. A percepção é apenas o primeiro e fundamental passo dos complexos processos de aprendizagem que, sem dúvida, implicam fenômenos de associação e recompilação.

  • Em terceiro lugar, é importante assinalar uma tendência a interpretar a aprendizagem em termos de percepção, recepção significativa, esquecendo de certa forma a importância da atividade, das ações e operações subjetivas na hora de fixar aquisições e de reformular os esquemas cognitivos. Ao fugir dos exageros do mecanicismo condutista, focaliza quase que exclusivamente a dimensão cognitiva e perceptiva do indivíduo, descuidando o importante mundo do comportamento.

  • Em quarto lugar, a necessária reação frente à concepção mecanicista e atomista da aprendizagem não tem por que supor o desprezo de todas as descobertas realizadas pela investigação analítica. Concretamente, certos experimentos de condicionamento esclarecem de forma importante os processos de algum tipo de aprendizagem que a criança realiza na primeira infância, bem como lança luz sobre aspectos parciais da dinâmica emocional que acompanha toda aprendizagem.

As contribuições da psicologia genético-cognitiva


(...) Desde o inestimável trabalho e a incomparável clarividência de Piaget e da Escola de Genebra que se formou ao seu redor, a extraordinária potência teórica dos princípios e proposições desta corrente não deixaram de se impor e se desenvolver, desde o começo do segundo terço do século XX até nossos dias. Piaget, Inhelder, Bruner, Flavell, Ausubel, etc. são os representantes desta vasta e fecunda corrente. Em nossa opinião, os resultados teóricos de suas investigações são hoje em dia imprescindíveis para compreender a complexidade da aprendizagem humana.

Desde os postulados defendidos pela Gestalt, parece óbvia a necessidade de esclarecer o funcionamento da estrutura interna do organismo como mediadora dos processos de aprendizagem. O importante não é afirmar a existência de tal instância mediadora, o verdadeiramente urgente é estudar sua estrutura, sua gênese, seu funcionamento. A psicologia genético-cognitiva enfrenta cara a cara o problema e apresenta certos princípios de explicação. O que é, como funciona e como se cria essa instância mediadora? Resumiremos a seguir os postulados mais relevantes desta importante corrente do pensamento psicológico.

  A aprendizagem como aquisição não-hereditária no intercâmbio com o meio é um fenômeno incompreensível sem sua vinculação à dinâmica do desenvolvimento interno. As estruturas iniciais condicionam a aprendizagem. A aprendizagem provoca a modificação e transformação das estruturas que, ao mesmo tempo, uma vez modificadas, permitem a realização de novas aprendizagens de maior riqueza e complexidade. A gênese mental pode ser representada como movimento dialético de evolução em espiral. No centro deste processo se encontra a atividade. A aprendizagem é tanto um fator como um produto do desenvolvimento. De qualquer forma, é um processo de aquisição no intercâmbio com o meio, mediatizado por estruturas reguladoras no princípio hereditárias, posteriormente construídas com a intervenção de aquisições passadas.

  As estruturas cognitivas são os mecanismos reguladores aos quais se subordina a influência do meio. São o resultado de processos genéticos. Não surgem num momento sem algum motivo, nem são o princípio imutável de todas as coisas. Também se constroem em processos de troca. Por isso, denomina-se estas posições como construtivismo genético.

  São dois os movimentos que explicam todo processo de construção genética: a assimilação, processo de integração, inclusive forçada e deformada, dos objetos ou conhecimentos novos às estruturas velhas, anteriormente construídas pelo indivíduo; e a acomodação, a reformulação e a elaboração de estruturas novas como conseqüência da incorporação precedente. Ambos os movimentos constituem a adaptação ativa do indivíduo que atua e reage para compensaras perturbações geradas em seu equilíbrio interno pela estimulação do ambiente.

  A vinculação entre aprendizagem e desenvolvimento leva ao conceito de "nível de competência". Em franca oposição à interpretação condutista, Piaget considera que, para que o organismo seja capaz de dar uma resposta, é necessário supor um grau de sensibilidade específica às incitações diversas do meio. Este grau de sensibilidade ou nível de competência se constrói no curso do desenvolvimento, da história do indivíduo a partir das aquisições da aprendizagem.

  O conhecimento não é nunca uma mera cópia figurativa do real, é uma elaboração subjetiva que desemboca na aquisição de representações organizadas do real e na formação de instrumentos formais de conhecimento. O conteúdo e a forma é uma decisiva distinção psicológica para as formulações normativas da didática. Ao distinguir os aspectos figurativos (conteúdo) dos aspectos operativos (formais) e ao subordinar os primeiros aos segundos, Piaget estabelece as bases para uma concepção didática baseada nas ações sensório-motoras e nas operações mentais (concretas e formais). Uma concepção que subordina a imagem e a intuição à atividade e operação, já que as formas do conhecimento, as estruturas lógicas que podem se aprofundar nas transformações do real são o resultado não dos objetos mas da coordenação das ações que o indivíduo exerce ao manipular e explorara realidade objetiva.

(...) A atividade, será a constante de todo tipo de aprendizagem, desde a que acontece na etapa sensório-motora até a que culmina com as operações formais. De qualquer forma, os conteúdos figurativos podem ser adquiridos mediante observação ou recepção, mas os aspectos operativos do pensamento só se configuram a partir das ações e da coordenação das mesmas. São estes aspectos operativos que caracterizam os níveis superiores do pensamento, da conduta intelectual do homem.

  Dentro deste processo dialético, que explica a gênese do pensamento e da conduta, são quatro os fatores principais que, segundo Piaget, intervêm no desenvolvimento das estruturas cognitivas e que a regulação normativa da aprendizagem não pode de modo algum ignorar: maturação, experiência física, interação social e equilíbrio.

Levando em conta estas colocações, cabe destacar sete conclusões de decisiva importância para facilitar e orientar a regulação didática dos processos de ensino­aprendizagem:

  Em primeiro lugar, o caráter construtivo e dialético de todo processo de desenvolvimento individual. O conhecimento e o comportamento são o resultado de processos de construção subjetiva nas trocas cotidianas com o meio circundante. A criança e o adulto constroem seus esquemas de pensamento e ação sobre os esquemas anteriormente elaborados e como conseqüência de suas interações com o mundo exterior. Dessa forma, os processos educativos preocupados em estimular e orientar o desenvolvimento podem ser concebidos como processos de comunicação que estimulam os intercâmbios do indivíduo com o meio físico e psicossocial que o rodeia.

  Em segundo lugar, a enorme significação que tem para o desenvolvimento das capacidades cognitivas superiores a atividade do aluno/a, desde as atividades sensório-motoras de discriminação e manipulação de objetos, até as complexas operações formais. Estas são atividades - que constituirão o objeto da prática na Escola Infantil   as responsáveis em grande medida pelo desenvolvimento satisfatório dos instrumentos formais do conhecimento.

  Em terceiro lugar, o espaço central que ocupa a linguagem como instrumento insubstituível das operações intelectuais mais complexas. Os níveis superiores do pensamento exigem um instrumento de expressão, um veículo de transporte que permita a variabilidade e a reversibilidade operacional. A falta de um desenvolvimento satisfatório deste instrumento é um handicap permanente para o exercício do pensamento formal.

  Em quarto lugar, a importância do conflito cognitivo para provocar o desenvolvimento do aluno/a. A criança progride questionando suas construções e esquemas cognitivos anteriores com os quais entendia a realidade. Sua interpretação necessariamente limitada e restrita da realidade cria esquemas de pensamento necessariamente deficientes, pois são parciais e limitados. O progresso requer o conflito cognitivo, a percepção da discrepância entre seus esquemas e a realidade ou as representações subjetivas da realidade elaboradas pelos demais. O conflito cognitivo pode ser perturbador e inibidor do desenvolvimento somente quando se converte de fora em conflito afetivo, quando se vinculam posições cognitivas com relações afetivas (por exemplo, entre as opiniões do pai ou da mãe, ou dos pais e dos professores/as) e se exige que a criança escolha vínculos afetivos quando somente deveria estar comparando e selecionando representações cognitivas.

  Em quinto lugar, a significação da cooperação para o desenvolvimento das estruturas cognitivas. A troca de opiniões, a comunicação de diferentes pontos de vista é a condição necessária para superar o egocentrismo do conhecimento infantil e permitir a descentração que exige a conquista da "objetividade".

  Em sexto lugar, a distinção e a vinculação entre desenvolvimento e aprendizagem Nem toda aprendizagem provoca desenvolvimento. É necessário levarem conta a interação da aquisições, o aperfeiçoamento e transformação progressiva das estruturas e esquemas cognitivos A acumulação de informações fragmentárias pode não configurar esquemas operativos d conhecimento e inclusive, algumas vezes, transformar-se em obstáculos ao desenvolvimento. A aprendizagem refere-se a conhecimentos particulares, enquanto que o pensamento e a inteligência são instrumentos gerais de conhecimento, interpretação e intervenção.

  Em sétimo lugar, a estreita vinculação das dimensões estrutural e afetiva da conduta. Como Piaget afirma:

"não existe estrutura alguma (cognição) sem um elemento ativador (motivação) e vice-versa. A motivação está sempre conectada com um nível estrutural (cognoscitivo) determinado" (Piaget, 1970). (...)


A aprendizagem significativa de Ausubel


As contribuições de Ausubel, apesar de, ou precisamente por, sua restrição a um espaço concreto, mas crítico, do âmbito da aprendizagem, são muito importantes para a prática didática. Ausubel aborda a aprendizagem escolar, que para ele é fundamentalmente "um tipo de aprendizagem que se refere a corpos organizados de material significativo" (Ausubel,1976). Centra sua análise na explicação da aprendizagem de corpos de conhecimentos que incluem conceitos, princípios e teorias. É a pedra fundamental do desenvolvimento cognitivo do homem e o objeto prioritário da prática didática.

A aprendizagem significativa, seja por recepção, seja por descoberta, opõe-se à aprendizagem mecânica, repetitiva, memorialística. Compreende a aquisição de novos significados. Agora, esta operação requer certas condições precisas em que Ausubel se detém e se preocupa em identificar:

"A essência da aprendizagem significativa reside em que as idéias expressadas simbolicamente são relacionadas de modo não-arbitrário, mas substancial, com o que o aluno/a já sabe. O material que aprende é potencialmente significativo para ele" (p. 57).

Assim, a chave da aprendizagem significativa está na vinculação substancial das novas idéias e conceitos com a bagagem cognitiva do indivíduo.

São duas as dimensões que Ausubel distingue na significação potencial do material de aprendizagem:

  Significação lógica: coerência na estrutura interna do material, seqüência lógica nos processos e conseqüência nas relações entre seus elementos componentes.

  Significação psicológica: que seus conteúdos sejam compreensíveis desde a estrutura cognitiva que o sujeito que aprende possui .

A potencialidade significativa do material é a primeira condição para que se produza a aprendizagem significativa. 0 segundo requisito é a disposição positiva do indivíduo em relação à aprendizagem. Uma disposição tanto conjuntural ou momentânea quanto permanente ou estrutural. Esta segunda condição se refere ao componente motivacional, emocional, de atitude, que está presente em toda aprendizagem. Evidentemente, isto também está presente nos tipos de aprendizagem de nível superior, como os que Ausubel destaca em seus trabalhos. (...)

O significado psicológico dos materiais de aprendizagem é idiossincrático, experiencial, histórico, subjetivo. Cada indivíduo capta a significação do material novo em função das peculiaridades historicamente construídas de sua estrutura cognitiva. A potencialidade significativa do material encontra-se subordinada em cada indivíduo às características de sua bagagem cognitiva. Deste modo, o planejamento didático de todo processo de aprendizagem significativa deve começar por conhecer a peculiar estrutura ïdeativa e mental do indivíduo que realizará as tarefas de aprendizagem.

Como se produz a vinculação do material novo com os conteúdos ideativos de cada indivíduo? Ausubel considera que a estrutura cognitiva de cada sujeito evidencia uma organização hierárquica e lógica, na qual cada conceito ocupa um lugar determinado em função de seu nível de abstração, de generalização e capacidade de incluir outros conceitos. Assim, na aprendizagem significativa "adquire-se os significados de idéias e preposições num processo de inclusão correlativa em estruturas mais genéricas. Aprendizagem de idéias incluintes ou incluídas" (Ausubel, 1970). Desta maneira, a aprendizagem significativa produz ao mesmo tempo a estruturação do conhecimento prévio e a extensão de sua potencialidade explicativa e operativa. Provoca sua organização, seu afiançamento ou sua reformulação em função da estrutura lógica do material que se adquire, sempre que existam as condições para sua assimilação significativa.

O material aprendido de forma significativa é menos sensível às interferências a curta prazo e muito mais resistente ao esquecimento, porque não se encontra isolado, mas assinalado a uma organização hierárquica dos conhecimentos que se referem à própria área temática. A aprendizagem anterior e posterior não só não interferirá, como, pelo contrário, reforçará a significação e importância da aprendizagem atual, sempre e quando continue sendo válida dentro do conjunto hierárquico. Uma aprendizagem desse tipo parece funcionar à base de organizadores, de idéias gerais com forte capacidade de inclusão e esquemas processuais, que indicam a estrutura da hierarquia e a seqüência de seu funcionamento. Assim, a realização desta aprendizagem pode se favorecer desde fora, sempre que se organize o material de uma forma lógica e hierárquica e se apresente em seqüências ordenadas em função de sua potencialidade de inclusão. (...)

Ausubel afirma, e com razão, que o processo de aquisição de significados é um processo ativo, mas, em nossa opinião, requer um tipo de atividade intelectual diferente da aprendizagem por descoberta, já que, para ambas são exigidos princípios explicativos e condições para realização diferentes. As habilidades de investigação e solução de problemas requerem a prática, a participação ativa do indivíduo, a busca real, e não a mera organização do recebido significativamente. O modelo de estratégia didática que as proposições de Ausubel sugerem é excessivamente racionalista, estático e receptivo, o que indica importantes problemas, especialmente quando a intervenção educativa acontece em contextos culturais muito distanciados das exigências conceituais das disciplinas do saber, e o principal desafio didático consiste em interessar ativamente os alunos/as nos conteúdos do currículo. (...)


O ponto de vista da psicologia dialética


Sob a orientação dos princípios psicológicos do materialismo dialético se desenvolve uma psicologia que durante todo nosso século produziu e continua produzindo contribuições de interesse para o campo da aprendizagem e do desenvolvimento cognitivo.

A escola soviética


Vygotsky, Luria, Leontiev, Rubinstein, Liublinsckaia, Talyzina, Galperin são, entre outros, os representantes mais significativos da escola soviética.

No tema que abordamos, a primeira proposição que é preciso considerar, já que condiciona as restantes, é a concepção dialética da relação entre aprendizagem e desenvolvimento. A validade dos estudos que a psicologia da aprendizagem realiza como independentes da análise do desenvolvimento é recusada dentro desses postulados. Para a psicologia soviética a aprendizagem está em função da comunicação e do desenvolvimento. Do mesmo modo, este último não é um simples desdobramento de caracteres pré-formados na estrutura biológica dos genes, mas o resultado do intercâmbio entre a informação genética e o contato experimental com as circunstâncias reais de um meio historicamente constituído.

O psiquismo e a conduta intelectual adulta é o resultado de uma peculiar e singular impregnação social do organismo de cada indivíduo. Essa impregnação não é um movimento unilateral, mas evidentemente dialético.

"A atividade psíquica constitui uma função do cérebro e um reflexo do mundo exterior, porque a própria atividade cerebral é uma atividade reflexa condicionada pela ação deste mundo" (Rubinstein, 1967, p. 187).

Será necessário, para compreender qualquer fenômeno de aprendizagem, determinar o nível de desenvolvimento alcançado em função das experiências prévias. Isso implica considerar o grau de complexidade alcançado pelas estruturas funcionais do cérebro. Na perspectiva didática, o nível de desenvolvimento alcançado não é um ponto estável, mas um amplo e flexível intervalo. Esta é uma das contribuições mais significativas de Vygotsky (1973).

"O desenvolvimento potencial da criança abrange desde sua capacidade de atividade independente até sua capacidade de atividade imitativa ou guiada" (Vygotsky, 1973).

É muito importante a compreensão deste princípio, área de desenvolvimento potencial ou zona de desenvolvimento proximal, pois é precisamente o eixo da relação dialética entre aprendizagem e desenvolvimento. Este tem uma dinâmica perfeitamente fluida, dentro de certos limites, pelas intervenções precisas da aprendizagem guiada intencionalmente. 0 que a criança pode fazer hoje com ajuda, favorece e facilita que o faça sozinha amanhã.

"A aprendizagem cria uma área de desenvolvimento potencial, estimula e ativa processos internos no marco das inter-relações, que se transformam em aquisições internas" (Vygotsky, 1973, p. 57).

Em evidente oposição a Piaget, Vygotsky chega a afirmar que o desenvolvimento segue à aprendizagem, já que esta é quem cria a área de desenvolvimento potencial.

É justamente esta concepção dialética da aprendizagem e do desenvolvimento que produz a divergência em relação à teoria genética de Piaget e, em particular, sua oposição à concepção de etapas do desenvolvimento. Para a psicologia dialética, a concepção piagetiana das etapas é, antes de mais nada, uma descrição que uma explicação do desenvolvimento. É uma formulação baseada nas manifestações aparentes e relativamente estáveis do desenvolvimento. Para a explicação da evolução da criança não importa muito se o indivíduo passou pela etapa simbólica e já se encontra na etapa operacional. 0 verdadeiramente definitivo é como cada indivíduo atravessou tais etapas, o que construiu nelas, que atividades realizou, etc. "As etapas não dependem diretamente da idade, mas do conteúdo concreto que a criança aprende a dominar" (Rubinstein, 1967, p. 193), ou seja, as crianças não se diferenciam apenas no ritmo de seu desenvolvimento. Sob a aparente semelhança que concede a permanência numa mesma etapa do desenvolvimento, a diferenciação individual consiste na orientação concreta que o indivíduo toma.

No entanto, é necessário indicar que, para a psicologia soviética, não são somente a atividade e a coordenação das ações que o indivíduo realiza as responsáveis pela formação das estruturas formais da mente, mas também a apropriação da bagagem cultural, que é produto da evolução histórica da humanidade que se transmite na relação educativa. As conquistas históricas da humanidade que se comunicam de geração em geração não só implicam conteúdos, conhecimentos da realidade espaço temporal ou cultural, mas também supõem formas, estratégias, modelos de conhecimento, de investigação, de relação..., que o indivíduo capta, compreende, assimila e pratica. Por isso, a psicologia soviética ressalta o valor da instrução, da transmissão educativa, da atividade tutorada, mais do que a atividade experimental da criança por si só.

De modo coerente com a proposição anterior, a escola soviética concede uma importância fundamental ao desenvolvimento da linguagem, pois a palavra é o instrumento mais rico para transmitir a experiência histórica da humanidade. Como opina Bogoyavlensky (1973), podemos afirmar uma dependência do desenvolvimento fisiológico em relação ao psicológico, sobretudo quando a criança, por meio da palavra, começa a assimilar a experiência histórica do gênero humano. A linguagem, pois, é o instrumento prioritário de transmissão social. Luria afirma que por meio da linguagem, da generalização verbal, a criança se torna dona de um novo fator de desenvolvimento, a aquisição da experiência humana social... A linguagem é assimilada na comunicação que desenvolve com os adultos e logo se transforma, de forma estável, de meio de generalizações em instrumento de pensamento e em instrumento para regular o comportamento (Luria, 1973).

Por outro lado, também para a psicologia soviética, e como conseqüência de caráter construtivista, a atividade do indivíduo é o motor fundamental do desenvolvim (Galperin, Leontiev, etc.). No entanto, não se concebe a atividade única, nem principalme como o intercâmbio isolado do indivíduo com seu meio físico, mas como a participação processos, geralmente em grupo, de busca cooperativa, de intercâmbio de idéias e concep e de ajuda na aprendizagem, na aquisição da riqueza cultural da humanidade.

Além disso, tampouco a experiência física que a criança realiza pode considerada, dentro desta perspectiva, como uma experiência neutra, carente de significado social. Pelo contrário, a escola soviética considera que toda experiência ocorre n mundo humanizado, com características que sustentam uma real intencionalidade só histórica subjacente às manifestações e ordenações dos elementos com que a cria ingenuamente experimenta. Dentro deste mundo objetivo mediatizado, condicionado e humanizado pelo homem inicia-se o desenvolvimento mental psíquico da criança (Leontiev 1973). Quando este se põe em contato com objetos materiais não só se interage com cores, formas, espaços, volumes, pesos e demais características físicas dos objeto instrumentos, como se põe em contato também com a intencionalidade social subjace à sua construção, bem como com a funcionalidade social com a qual se utiliza tal obj ou artefato nos processos de uso ou intercâmbio.

Se a criança em suas trocas espontâneas com o meio físico e psicossocial se p em contato com o sentido dos objetos, dos artefatos, das instituições, dos costume todo tipo de produções sociais, é de se pensar que a escola, de forma sistemática, cuia aquisição mais depurada e organizada do substrato de idéias, significados' intencionalidade que configuram a estrutura social e material da comunidade na qual desenvolve a vida do futuro cidadão/dã.

A escola de Wallon (Wallon, Zazzo, Merani)

A psicologia genético-dialética francesa de Wallon reafirma os postulados principais da escola soviética. (...).

Desde a origem, o pensamento vincula-se com aspectos emotivos, afetivos, com os quais estabelecerá um discurso permanente cheio de contradições e apoios. A importância que Wallon atribui à motivação intrínseca não é mais do que a expressão da natureza de suas concepções genéticas.

A dissociação entre afetividade e pensamento é metodológica, artificial e não pode transformar-se num princípio de procedimento na escola. Toda a atividade cognitiva da criança implica, em sua origem, seu desenvolvimento, ou sua conclusão, inevitável componentes afetivos que por si mesmos impulsionam a aprendizagem. Quando o ensina recorre a motivações extrínsecas é preciso perguntar-se o quanto separadas estão a tarefas empreendidas da realidade vital que preocupa o sujeito.

Se a conduta é explicada pelas condições de sua gênese, a tarefa principal da prática pedagógica na escola será procurar as condições satisfatórias que provoquem um pensamento, uma forma de sentir e uma conduta desejadas. No entanto, não se pode esquecer, para não cair no criticado condutismo, que parte destas condições é de natureza interna, e em nenhum momento pode ser ignorada. A penetração social do biológico produz um novo e superior nível de realidade que funciona de forma autônoma com seus próprios ritmos e leis. As estruturas psicológicas serão desde agora a variável mais importante da aprendizagem, tendo sempre presente que tais estruturas são redes complexas e interativas de pensamento, emoção e atividade.

É importante a contribuição do esquecido Wallon, já que a tendência intelectualista, generalizada na escola contemporânea, parece ignorar os determinantes afetivos e emotivos do pensamento e da conduta do aluno/a. (...)


A aprendizagem como procedimento de informação


Desde os anos 60 se desenvolve uma perspectiva de extraordinária importância para a explicação psicológica da aprendizagem. Essa perspectiva, que integra contribuições do modelo condutista, dentro de um esquema fundamentalmente cognitivo, ao ressaltar a importância das estruturas internas que mediatizam as respostas conseguiu chamar a atenção da maior parte das investigações atuais no campo da psicologia da aprendizagem e da didática. Sob suas orientações se estabelece o diálogo entre neocondutistas e as correntes atuais da aprendizagem cognitiva.

Neste sentido, e como exemplo deste diálogo e permeabilidade de posições entre neocondutistas e cognitivos, assim como de suas claras derivações didáticas, cabe ressaltar o trabalho de Gagné. Distingue oito tipos de aprendizagem, que, embora formem um contínuo cumulativo e hierárquico, devem se considerar na realidade como aprendizagens diferentes, pois necessitam condições distintas e acabam em resultados diversos. Estes tipos de aprendizagem exigem formas prévias mais simples como requisito para as mais complexas.

  Aprendizagem de sinais: aprender a responder a um sinal (Pavlov).

  Aprendizagem estímulo-resposta: aprendizagem de movimentos precisos nos músculos em resposta a estímulos ou combinações de estímulos muito precisos também (Skinner, Thordike).

  Encadeamento: conectar numa série duas ou mais associações de estímuloresposta previamente adquiridas (Skinner, Gilbert).

  Associação verbal: variedade verbal de encadeamento (Underwood).

  Discriminação múltipla: conjunto de cadeias de identificação ao discriminar sucessivamente estímulos precisos e respostas específicas (Mowrer, Postman).

  Aprendizagem de conceitos: aprender é responder a estímulos como partes de conjuntos ou classe em função de suas propriedades abstratas (Bruner, Kendler, Gagné).

 Aprendizagem de princípios: aprendizagem de cadeias de dois ou mais conceitos, aprendizagem de relações entre conceitos (Berlyne, Gagné, Bruner).

 Resolução de problemas: aprendizagem da combinação, relação e manipulação coerente de princípios para entender e controlar o meio, solucionar problemas (Simon, Newell, Bruner, etc.),

É necessário dizer que Gagné, embora apresente e afirme a necessidade seqüencial dos oito tipos de aprendizagem, atribui muito maior importância à aprendizagem de conceitos, princípios e solução de problemas, por serem as aprendizagens características da instrução escolar e constituir o eixo do comportamento inteligente do homem (Gagné, 1970, 1975).

Modelos de aprendizagem baseados na perspectiva do processamento de informação e simulação do comportamento

Os modelos de processamento de informação como tentativa de explicar a conduta cognitiva do ser humano são relativamente recentes. Pode-se afirmar que são Newell, Shaw e Simon, em 1958, os precursores de uma nova orientação cognitiva nos traba e nas pesquisas sobre os processos de aprendizagem. Uma recente orientação que produzindo resultados interessantes no âmbito da memória e que conseguiu estabelecer o diálogo entre neo-condutistas, neopiagetianos e demais correntes cognitivas. Os trabalhos de Neisser, Adams, Lindsay, Norman, Anderson, Mayer, Bower, Pascual Leone, Mandler, Atkinson e os anteriormente citados Newell e Simon são uma pequena amostra da imporá crescente desta nova perspectiva que conta com escassos 30 anos de existência.

O modelo de processamento de informação considera o homem como processador de informação, cuja atividade fundamental é receber informação, elabor e agir de acordo com ela. Isso significa que todo ser humano é um ativo processado sua experiência mediante um complexo sistema no qual a informação érecebi transformada, acumulada, recuperada e utilizada. Isso supõe que o organismo não respo diretamente ao mundo real mas à própria e mediada representação subjetiva do mesmo. Uma mediação que seleciona, transforma e, inclusive, distorce com freqüência o cará dos estímulos recebidos. Éclaramente uma perspectiva cognitiva, enquanto implic primazia dos processos internos, mediadores entre o estímulo e a resposta."

A concepção "bancária" da educação como instrumento da opressão. Seus pressupostos, sua crítica21

Paulo Freire

"Quanto mais analisamos as relações educador-educandos, na escola, em qualquer de seus níveis (ou fora dela), parece que mais nos podemos convencer de que estas relações apresentam um caráter especial e marcante   o de serem relações fundamentalmente narradoras, dissertadoras.

Narração de conteúdos que, por isto mesmo, tendem a petrificar-se ou a fazer-se algo quase morto, sejam valores ou dimensões concretas da realidade. Narração ou dissertação que implica um sujeito   o narrador   e objetos pacientes, ouvintes   os educandos.

Há uma quase enfermidade da narração. A tônica da educação é preponderantemente esta   narrar, sempre narrar.

Falar da realidade como algo parado, estático, compartimentado e bem-comportado, quando não falar ou dissertar sobre algo completamente alheio à experiência existencial dos educandos vem sendo, realmente, a suprema inquietação desta educação. A sua irrefreada ânsia. Nela, o educador aparece como seu indiscutível agente, como o seu real sujeito, cuja tarefa indeclinável é "encher" os educandos dos conteúdos de sua narração. Conteúdos que são retalhos da realidade desconectados da totalidade em que se engendram e em cuja visão ganhariam significação. A palavra, nestas dissertações, se esvazia da dimensão concreta que devia ter ou se transforma em palavra oca, em verbosidade alienada e alienante. Daí que seja mais som que significação e, assim, melhor seria não dizê-la.

Por isto mesmo é que uma das características desta educação dissertadora é a "sonoridade" da palavra e não sua força transformadora. Quatro vezes quatro, dezesseis: Pará, capital Belém, que o educando fixa, memoriza, repete, sem perceber o que realmente significa quatro vezes quatro. O que verdadeiramente significa capital, na afirmação, Pará, capital Belém. Belém para o Pará e Pará para o Brasil 22.

A narração, de que o educador é o sujeito, conduz os educandos à memorização mecânica do conteúdo narrado. Mais ainda, a narração os transforma em "vasilhas", em recipientes a serem "enchidos" pelo educador. Quanto mais vá "enchendo" os recipientes com seus "depósitos". tanto melhor educador será. Quanto mais se deixem docilmente "encher", tanto melhores educandos serão.

Desta maneira, a educação se torna um ato de depositar, em que os educandos são os depositários e o educador o depositante.

Em lugar de comunicar-se, o educador faz "comunicados" e depósitos que os educandos, meras incidências. recebem pacientemente, memorizam e repetem. Eis aí a concepção "bancária" da educação, em que a única margem de ação que se oferece aos educandos é a de receberem os depósitos, guardá-los e arquivá-los. Margem para serem colecionadores ou fichadores das coisas que arquivam. No fundo, porém, os grandes arquivados são os homens, nesta (na melhor das hipóteses) equivocada concepção "bancária" da educação. Arquivados, porque, fora da busca, fora da práxis. os homens não podem ser. Educador e educandos se arquivam na medida em que, nesta distorcida visão da educação, não há criatividade, não há transformação, não há saber. Só existe saber na invenção, na reinvenção, na busca inquieta. impaciente. permanente, que os homens fazem no mundo, com o mundo e com os outros. Busca esperançosa também.

Na visão "bancária" da educação, o "saber" é uma doação dos que se julga sábios aos que julgam nada saber. Doação que se funda numa das manifestações instrumentais da ideologia da opressão   a absolutização da ignorância. que constitui o q chamamos de alienação da ignorância, segundo a qual esta se encontra sempre no outro lado.

O educador. que aliena a ignorância, se mantém em posições fixas, invariáveis. Será sempre o que sabe, enquanto os educandos serão sempre os que não sabem. rigidez destas posições nega a educação e o conhecimento como processos de busca

O educador se põe frente aos educandos como sua antinomia necessári Reconhece na absolutização da ignorância daqueles a razão de sua existência. educandos, alienados, por sua vez, à maneira do escravo na dialética hegeliana, reconhecem sua ignorância a razão da existência do educador, mas não chegam, nem sequer modo do escravo naquela dialética, a descobrir-se educadores do educador.

Na verdade, como mais adiante discutiremos, a razão de ser da educação libertadora está no seu impulso inicial conciliador. Daí que tal forma de educação implíque a superação da contradição educador-educandos, de tal maneira que se façam ambos simultaneamente, educadores e educandos.

Na concepção "bancária" que estamos criticando, para a qual a educação é o a de depositar, de transferir, de transmitir valores e conhecimentos, não se verifica n pode verificar-se esta superação. Pelo contrário. refletindo a sociedade opressora, sen dimensão da "cultura do silêncio", a "educação" "bancária" mantém e estimula a contradição.

Daí, então, que nela:



  1. o educador é o que educa; os educandos, os que são educados;

  2. b) o educador é o que sabe; os educandos, os que não sabem;

  3. c) o educador é o que pensa; os educandos, os pensados;

  4. d) o educador é o que diz a palavra; os educandos, os que a escutam docilmente;

  5. e) o educador é o que disciplina; os educandos, os disciplinados;

  6. f) o educador é o que opta e prescreve sua opção; os educandos, os q seguem a prescrição;

  7. g) o educador é o que atua; os educandos, os que têm a ilusão de que atuam, atuação do educador;

  8. h) o educador escolhe o conteúdo programático; os educandos, jamais ouvidos nesta escolha, se acomodam a ele;

  9. i) o educador identifica a autoridade do saber com sua autoridade funcional, q opõe antagonicamente à liberdade dos educandos; estes devem adaptar-se determinações daquele;

  10. j) o educador, finalmente, é o sujeito do processo; os educandos, meros objetos.

Se o educador é o que sabe, se os educandos são os que nada sabem, ca àquele dar, entregar, levar, transmitir o seu saber aos segundos. Saber que deixa de ser de "experiência feito" para ser de experiência narrada ou transmitida.

Não é de estranhar, pois, que nesta visão "bancária" da educação, os homens sejam vistos como seres da adaptação, do ajustamento. Quanto mais se exercitem educandos no arquivamento dos depósitos que lhes são feitos, tanto menos desenvolverão em si a consciência crítica de que resultaria a sua inserção no mundo, como transformadores dele. Como sujeitos.

Quanto mais se lhes imponha passividade, tanto mais ingenuamente, em lugar de transformar, tendem a adaptar-se ao mundo, à realidade parcializada nos depósitos recebidos.

Na medida em que esta visão "bancária" anula o poder criador dos educandos ou o minimiza, estimulando sua ingenuidade e não sua criticidade, satisfaz aos interesses dos opressores: para estes, o fundamental não é o desnudamento do mundo, a sua transformação. O seu "humanitarismo", e não humanismo, está em preservara situação de que são beneficiários e que lhes possibilita a manutenção de sua falsa generosidade a que nos referimos no capítulo anterior. Por isto mesmo é que reagem, até instintivamente, contra qualquer tentativa de uma educação estimulante do pensar autêntico, que não se deixa emaranhar pelas visões parciais da realidade, buscando sempre os nexos que prendem um ponto a outro, ou um problema a outro.

Na verdade, o que pretendem os opressores "é transformar a mentalidade dos oprimidos e não a situação que os oprime"23, e isto para que, melhor adaptando-os a esta situação, melhor os dominem.

Para isto se servem da concepção e da prática "bancárias" da educação, a que juntam toda uma ação social de caráter paternalista, em que os oprimidos recebem o nome simpático de "assistidos". São casos individuais, meros "marginalizados", que discrepam da físionomia geral da sociedade. "Esta é boa, organizada e justa. Os oprimidos, como casos individuais, são patologia da sociedade sã, que precisa, por isto mesmo, ajustá-los a ela, mudando-lhes a mentalidade de homens ineptos e preguiçosos."

Como marginalizados, "seres fora de" ou "à margem de", a solução para eles estaria em que fossem "integrados", "incorporados" à sociedade sadia de onde um dia "partiram", renunciando, como trânsfugas, a uma vida feliz.

Sua solução estaria em deixarem a condição de ser "seres fora de" e assumirem a de "seres dentro de".

Na verdade, porém, os chamados marginalizados, que são os oprimidos, jamais estiveram fora de. Sempre estiveram dentro de. Dentro da estrutura que os transforma em "seres para outro". Sua solução, pois, não está em "integrar-se", em "incorporar-se" a esta estrutura que os oprime, mas em transformá-la para que possam fazer-se " seres para si".

Este não pode ser, obviamente, o objetivo dos opressores. Daí que a "educação bancária"; que a eles serve, jamais possa orientar-se no sentido da conscientização dos educandos.

Na educação de adultos, por exemplo, não interessa a esta visão "bancária" propor aos educandos o desvelamento do mundo, mas, pelo contrário, perguntar-lhes se "Ada deu o dedo ao urubu", para depois dizer­lhes enfaticamente, que não, que "Ada deu o dedo à arara".

A questão está em que pensar autenticamente é perigoso. O estranho humanismo desta concepção "bancária" se reduz à tentativa de fazer dos homens o seu contrário - o autômato, que é a negação de sua ontológica vocação de ser mais.

O que não percebem os que executam a educação "bancária", deliberadamente não (porque há um sem-número de educadores de boa vontade, que apenas não se sabe a serviço da desumanização ao praticarem o "bancarismo"), é que nos próprios "depósito se encontram as contradições, apenas revestidas por uma exterioridade que as oculta. E que, cedo ou tarde, os próprios "depósitos" podem provocar um confronto com a realidade em devenir e despertar os educandos, até então passivos. contra a sua "domesticação".

A sua "domesticação" e a da realidade, da qual se lhes fala como algo estático, pode despertá-los como contradição de si mesmos e da realidade. De si mesmos. ao se descobrirem, por experiência existencial, em um modo de ser inconciliável com a sua vocação de humanizar-se. Da realidade, ao perceberem-na em suas relações com ela, como devenir constante.



A concepção problematizadora e libertadora da educação.
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