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Centro espírita nosso lar grupo de estudo das obras de andré luiz e manoel philomeno de miranda


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(Fonte: 2a parte, capítulos I a V.)
1. Cláudio ajoelha-se e chora ao pé da filha - As condições pre­cárias de Marita exigiam repouso, quietação. Iniciada a laboriosa re­moção, que Cláudio e o vampirizador seguiram de longe, a cabeça da jo­vem, pendida para trás, impeliu o sangue a movimento retrógrado, com possibilidade de asfixia. Félix controlou, quanto pôde, as mãos dos condutores e, tão logo ela se ajustou em novo leito, André valeu-se do socorro magnético de profundidade que as circunstâncias exigiam. Sen­tado, de maneira a guardar aquele corpo abatido em seus braços, André envolveu-o no seu próprio hálito, numa operação que chamou de adição de força e cujos resultados se destacam surpreendentes, quando a cria­tura retida no envoltório físico se mostra nos últimos lances da re­sistência. Nesse momento, Félix aconselhou que André se adensasse na apresentação, a fim de que Moreira o visse. Conservava a esperança de vê-lo oferecer-se para manter a respiração da moça em boa ordem. André orou, empenhando-se na consecução do objetivo, e o vampirizador, logo que entrou no recinto, deitou-lhe olhar espantadiço. Cláudio e ele cambalearam sensibilizados, aflitos... Incoercível emoção tomou a alma de André, porque ao abeirar-se, trêmulo, da filha Cláudio rompeu em soluços e, instintivamente, tornou à infância e à mocidade, relem­brando as primeiras leviandades e enfileirando na imaginação os desva­rios sexuais das trilhas percorridas. Cada jovem que iludira, cada mulher de que abusara repontavam-lhe na tela mental, como que a lhe perguntarem pela filha que a vida lhe trouxera... Perante a enfermeira impressionada, Cláudio ajoelhou-se e, com ele, pôs-se Moreira, genu­flexo... Em choro convulso, o pai alisou aqueles cabelos despenteados e, mergulhando a cabeça nos lençóis, gritou, vencido: "Ah! minha filha!... minha filha!..." E, quase no mesmo instante, a fronte de Mo­reira vergou, como se esmagada de sofrimento... Jaziam ambos, ali, de­bruçados, rente a André, com a mesma rendição dentro da qual Marita se lhe conchegava ao regaço. Compreendendo que os verdugos também pediam amor, André afagou-os com a destra, sustentando-se na prece, que lhe clareava o pensamento e lhe corrigia a visão. Refletindo nos próprios erros, André compreendeu, então, que eles não eram os estupradores, os obsessores, os inimigos, os carrascos que detestara na véspera, mas também seus amigos, seus irmãos!... (2a parte, cap. I, pp. 183 e 184)
2. Moreira passa a ajudar a enferma - Félix, sereno, acercou-se de Cláudio, administrou-lhe energias de refazimento e, após levantá-lo, despediu-se, avisando que voltaria e enviaria cooperadores. Cláu­dio também se afastou, buscando o especialista. Moreira, que observara André desde a chegada, fitava-o agora com simpatia. Em dado momento, amaciando o tom de voz, disse reconhecê-lo e queixou-se dos irmãos de­sencarnados que se avizinhavam da porta e acenavam com asco, apontando Marita com desprezo. Alguns traçavam gestos no ar, sugerindo quadros obscenos, outros faziam figurações despudoradas, e um deles chegou ao desplante de indagar quem era aquela mulher que transpirava carniça... André o consolou, informando que tudo aquilo passaria, pois esperava companheiros abastecidos com os recursos necessários para isolamento do quarto. Em seguida, afirmando ter presenciado o acidente, rogou a Moreira permissão para cooperar. Ficaria contente se ele lhe aceitasse o concurso ali, ao pé daquela jovem, pois, havendo colhido alguma ex­periência em hospitais, poderia ser útil. Moreira comoveu-se e aprovou a idéia. Sim, disse ele, devotava-se à Marita com ardente afeição e contaria com André. Conhecia meios de auxiliá-lo, defendê-lo-ia, ser-lhe-ia companheiro fiel. Depois, examinou o processo pelo qual a res­piração da moça era auxiliada e pediu instruções. Desejava substituí-lo. E se colocou com tanta diligência e humildade, que, em breves mi­nutos, atendia à manutenção da jovem, com segurança superior à que An­dré se esforçava em cultivar. Diante disso, André con­cluiu que nem sempre é o salva-vidas tecnicamente construído a peça que assegura a sobrevivência do náufrago, e sim o lenho agressivo que teimamos em desdenhar. (2a parte, cap. II, pp. 185 e 186)
3. Márcia recusa-se a ir ao hospital - Cláudio, enquanto aguar­dava o médico, telefonou para dona Márcia. A esposa folgava em saber que Marita estava viva, mas entendia que, se a Medicina já entrara em cena, era melhor encerrarem o assunto. Cláudio rogou-lhe, contudo, que ela comparecesse ao hospital, para amenizar a situação. Márcia esqui­vou-se, alegando compromissos inadiáveis. E fez ironia, dizendo que, se Marita estava tão mal quanto ele dizia, cabia a ele, na condição de pai, permanecer ao lado dela, eximindo-a de sacrifícios maiores do que aqueles que já lhe sobrecarregavam os ombros. Na verdade, dona Márcia ficou desapontada com a notícia de que Marita não estava morta, o que impelia os constrangimentos da família à estaca zero. Declarando-se, por fim, cansada de bobagens e arrufos entre jovens namorados, dona Márcia afirmou preferir tricotar a fazer adulação para uma filha que não era sua e que sempre timbrara em loucura e faniquito. Cláudio, de­solado, insistiu, pintando o quadro em que se contristava, mas a mu­lher encerrou a conversa, atirando-lhe uma frase que lhe despedaçou as esperanças: "Bem, Cláudio, tudo isso é problema seu". Ele discou então para a residência dos Torres. Como Marina ainda não chegara de Teresó­polis, telefonou a seu chefe, a quem, após sucinto relatório dos acon­tecimentos, solicitou a concessão de férias. O diretor prometeu aju­dar. Em seguida, conversou com o médico, que disse ser cedo para um pronunciamento mais claro. Cláudio pediu para a filha o melhor tra­tamento. Não importava o quanto custasse. Acomodada a filha em novo quarto, viu-se que aqueles dois Espíritos, que antes se avalentoavam por bagatela, manifestavam-se então diferentes, submissos. Cláudio trazia os olhos marejados de pranto. Partira-se-lhe a alma. A certeza de que Marita tentara o suicídio, por culpa sua, requeimava-lhe o co­ração... (2a parte, cap. II, pp. 187 e 188)
4. Salomão, o boticário, vai ao hospital - O passado remoía a ca­beça de Cláudio... Delitos que supunha para sempre esquecidos asso­mavam-lhe agora à lembrança, exigindo reparação... Lembrou-se de Ara­célia, a mãe de Marita que ele próprio aniquilara, a peso de sarcasmo e ingratidão... A imagem daquela moça inexperiente da roça crescia-lhe por dentro. Lastimava-se, acusava, perguntava pela filha, pedindo-lhe contas!... Cláudio julgava-se às portas da loucura. Não fosse o desejo de recuperar a filha prostrada, usaria o revólver contra si mesmo, porquanto o suicídio se lhe afigurava como sendo a válvula de livra­mento. Se Marita morresse, não desejaria sobreviver. Enquanto as re­flexões de Cláudio lhe obscureciam a mente, Moreira colava-se aos pulmões da triste menina, num espetáculo comovedor de paciência e de­dicação. O corpo machucado não lhe inspirava repugnância. Enlaçava Ma­rita com a veneração de quem se consagra a uma filha padecente... Aquele Espírito a amava profundamente, porque é preciso amar alguém, com extremada ternura, para sorver-lhe com alegria o hálito fétido e acariciar-lhe a pele manchada de excrementos... O dia avançou. Ò tarde, a solidão fez com que Cláudio telefonasse para Marina. Eram três da tarde. A filha disse-lhe ter esperança de que a ocor­rência não passasse de um susto, mas alegou não ser possível com­parecer ao hospi­tal, porque dona Beatriz piorara muito. Cláudio regressou ao quarto, esma­gado pelo desânimo. Ninguém o apoiava, ninguém entendia-lhe o su­plício moral. Òs cinco horas, no entanto, ele recebeu a visita de Sa­lomão, o farmacêutico, que se declarou amigo de Marita e seu vizinho de loja. Di­zendo ter sido uma das últimas pessoas com quem ela conver­sara, antes do acidente, ele narrou ao pai aflito, pormenor a porme­nor, o quanto sabia. Com certeza, a jovem ingerira os soporíferos que lhe dera e, identificando-lhes o caráter inofensivo, projetara-se sob um automóvel em disparada... (2a parte, cap. II, pp. 189 a 191)
5. Marita recebe passes e melhora - Cláudio ouviu-o, chorando... Sem dúvida, a filha não pudera sobreviver ao insulto que ele lhe fi­zera... Considerando-se o mais abjeto dos homens e amargamente arre­pendido de seus atos, abraçou Salomão, num impulso de louvável since­ridade, salientando que ele, o visitante gentil, era o verdadeiro e talvez o único amigo daquela criança que procurara a morte e que tudo fariam para reaver. O farmacêutico, apiedado, arriscou um alvitre. Confessando-se espírita, assinalou que os passes, sob a cobertura da oração, beneficiariam a menina prostrada. Se Cláudio permitisse, bus­caria o senhor Agostinho, a quem poderiam recorrer. Cláudio aceitou com humildade. Não lhe seria lícito recusar um auxílio oferecido com tanta espontaneidade. Queria apenas rogar a permissão do facultativo em serviço. O médico, homem experimentado em angústias hu­manas, asse­verou que Cláudio dispunha do direito de prestar à filha a assistência religiosa que desejasse, e que, dentro do quarto, ele es­tava como em sua própria casa. Compadecido, prometeu favorecer, ele próprio, a vinda de Salomão com o espírita que indicasse. Foi assim que, às oito da noite, Salomão e seu amigo penetraram o quarto de Ma­rita. Cláudio espantou-se, porquanto o senhor Agostinho, um comer­ciante distinto, era um dos clientes mais respeitados em seu banco. O novo amigo inte­ressou-se delicadamente pela moça e inteirou-se de to­das as minudên­cias do desastre. Em seguida, orou, emocionado, supli­cando a bênção do Cristo para a menina atropelada e aplicou-lhe passes de longo curso. Moreira a tudo assistia, sequioso de aprender. O atendimento infundiu grande bem à moça, melhorando-lhe a condição geral. A respiração deso­primiu-se. Marita conseguiu entrar, enfim, em sono calmo. Na saída, Agostinho ofereceu a Cláudio o livro que trazia, um exemplar de "O Evangelho segundo o Espiritismo", prometendo voltar na manhã se­guinte. (2a parte, cap. II, pp. 191 e 192)
6. Cláudio é induzido a ler o Evangelho - Cláudio, logo que os dois amigos saíram, ficou no seu aposento, a pensar. A presença de Agostinho entre os espiritistas agitava-lhe o espírito. Comerciante abastado e instruído, não se deixaria enrolar em tapeações. Conhecia-lhe a agudeza de raciocínio, a honestidade. Além disso, possuiria ocu­pações mais vantajosas em que aplicar atenção e tempo. Que doutrina seria aquela, capaz de induzir um homem respeitável a entrar em prece, num quarto de hospital, chorando de compaixão por uma menina à beira da sepultura? Que princípios impeliam, assim, um homem educado e rico a esquecer-se, no socorro aos infelizes, imbuído daquele amor que so­mente os pais conhecem? Fitou Marita que dormia, calma, e recordou os dois homens abnegados que lhe haviam trazido alívio, sem nada pergun­tar... Ele, que jamais se aproximara de ensinamentos religiosos, aco­lhia-se agora a vasta série de porquês. Abafado, agoniava-se com a sede de algo... Aspirava a sair, correr ao encontro de Agostinho e Sa­lomão, a fim de perguntar-lhes pela fé em Deus. Anelava inteirar-se de como conseguiam entesourar tanta crença. Reconhecendo-se enfermo da alma, náufrago que afundava no redemoinho do desespero, queria agar­rar-se a alguém, a alguma coisa. Tinha fome de companhia. Vendo-lhe tais idéias, André sugeriu-lhe a leitura. O livro com que fora brin­dado ser-lhe-ia companheiro. Cláudio assimilou a indução e tomou a brochura. Acusava-se, no entanto, incapaz, inquieto, sem serenidade para ler com aplicação ao assunto. André insistiu. Os dedos de Cláudio tatearam, então, o índice e, através das legendas, esbarrou no cap. XII com o item intitulado "Caridade para com os criminosos". (2a parte, cap. III, pp. 193 e 194)

7. Cláudio descobre no livro um mundo novo - Cláudio, embora aca­tado no hospital como pai carinhoso, sabia perfeitamente não passar de estuprador e filicida, e carregava a dor irremediável de ha­ver impe­lido a filha à loucura e à morte... Que condenações aquele livro enfi­leiraria contra ele? Aberto o volume, ele viu, para surpresa sua, que o Evangelho não lhe amaldiçoava a presença. Leu e releu, cho­rando, aquelas frases que ressumavam brandura e entendimento. Identi­ficou-se à frente de um apelo à fraternidade e à compaixão, que não pintava os delinqüentes por seres infernais, ausentes da órbita do Amor Divino. A pequena mensagem concitava à tolerância e terminava ro­gando preces, a benefício dos que sucumbem na voragem do mal. As lá­grimas borbotaram-lhe mais profusamente dos olhos!... Aquelas palavras chamavam-no à ra­zão e mostravam-lhe que o mundo e a vida deviam estar banhados de pro­funda misericórdia... Aquele primeiro contacto com as verdades do es­pírito fendia-lhe, de alto a baixo, a cidadela do ateísmo. Com a so­freguidão do sedento que atravessa longo deserto, atirou-se, então, aos textos, de cujos caracteres vertiam idéias es­clarecedoras e balsâ­micas, como torrentes de água pura. Esquadrinhou vários temas... Ad­quiriu conhecimentos rápidos acerca da reencarnação e da pluralidade dos mundos, meditou nas maravilhas da caridade e nos prodígios da fé, através das chamas imortais do Cristianismo que ali renasciam para ele... Quando olhou o reló­gio, este marcava duas da madrugada. Varara, sem perceber, quatro ho­ras mergulhado no livro e sentia-se outro. A idéia da reencarnação re­lampejou-lhe na cabeça. Por que amava tanto aquela menina? Sem dúvida, ele e ela remanesciam de experiências ante­riores e algo lhe dizia que ele a trouxera, de novo, para o mundo, através da paternidade, a fim de orientá-la com limpeza e abnega­ção!... (2a parte, cap. III, pp. 195 e 196)


8. Cláudio pede perdão à filha amada - As realidades do destino se alteavam do pensamento de Cláudio, belas e difusas, mas, ainda as­sim, ele não se desculpava, reconhecendo haver agravado os próprios débitos. Entrevendo, então, as realidades da vida Além-Túmulo, apelou para os amigos que vira partir!... Que se apiedassem dele e de Marita! que suplicassem a Deus trocar a sua existência pela dela, de modo a expiar, no mundo espiritual, as próprias faltas, renascendo depois, mutilado, a fim de ressarcir os débitos contraídos... E, se lhe cabia continuar no mundo, transportando no peito a angústia daquela hora, que a deixassem mesmo assim, abatida e muda, em seus braços! Teria forças para carregá-la... Ser-lhe-ia apoio e refúgio... Aconchegá-la-ia, de algum modo, ao coração... Obteria uma cadeira de rodas e con­duzi-la-ia a qualquer parte, acolhendo, sem reclamar, quaisquer obstá­culos... Que a Providência Divina poupasse Marita ao gládio da morte para que não faltasse a ele o ensejo do reajuste e da reparação!... André o abraçou, confortando-o e inspirando-lhe esperança. Confiasse. Quem estaria na Terra sem problemas? Era preciso interpretar o remorso por marca vermelha, suscitando parada. Conviria frear o carro dos pró­prios desejos e pensar, pensar!... Depois da escuridão, a alvorada não tardaria. Urgia, pois, levantar os sentimentos para a renovação que começava!... Moreira, que a tudo assistia, endereçou a André ansioso olhar. Antes, porém, que ele se abeirasse do pai de Marita, André ape­lou para Cláudio, inclinando-o a iniciar, ali mesmo, a obra repara­dora. O bancário não vacilou. Ajoelhou-se à cabeceira da filha, acari­ciou-a com uma espécie de ternura que jamais experimentara e, deixando que as lágrimas lhe orvalhassem o rosto, suplicou, em surdina: "Perdão, minha filha!... Perdão para seu pai!..." Marita não respon­deu, mas o afago paternal instilou-lhe energia diferente e André re­gistrou, espantado, o gemido que ela desferiu, denotando sinais de re­torno a si mesma. (2a parte, cap. III, pp. 196 a 198)
9. Moreira sente Cláudio escapar-lhe - Outros gemidos repeti­ram-se imprecisos, dolorosos... O pai escutava-os, ralado de angústia, e, entendendo que eles exprimiam padecimentos físicos inenarráveis, ago­niou-se em choro convulsivo. Moreira, o ex-vampirizador, abraçou-o, no intuito de reconfortá-lo, e André pôde notar que os dois amigos ja­ziam agora perto e longe um do outro. Juntos por fora, distantes por den­tro. Os acontecimentos atingiram Moreira de forma diferente. Embora tivesse enorme afeição por Marita, nutria o propósito de continuar controlando Cláudio. Identificando, porém, o parceiro tocado no cora­ção pelos sentimentos edificantes que a leitura lhe sugerira, revelava grande desapontamento e, por isso, crivou André de perguntas. Este procurou sossegá-lo, mas, no íntimo, sabia que, tendo Cláudio dado um passo adiante, Moreira deveria elevar-se no mesmo diapasão, se qui­sesse desfrutar-lhe a convivência. A mente do bancário emergira daque­las horas de estudo, como uma paisagem varrida por terremoto. Nenhuma analogia havia com o que era antes. Por isso, o outro enfadava-se, me­lindrado, triste. Nesse ponto, dois auxiliares enviados por Félix che­garam ao recinto. Simpáticos e espontâneos, ao serem apresentados a Moreira, reconheceram, de pronto, a posição espiritual do ex-vampiri­zador, mas, mesmo assim, rodearam-no de otimismo e bondade, qualifi­cando-o na categoria de colega estimável. Como o dia estava prestes a nascer, André acercou-se de Cláudio no intuito de fazê-lo dormir. Com iniludível desgosto, Moreira viu o cuidado com que André administrou-lhe passes balsâmicos, aos quais o paciente aquiesceu sem qualquer contradita. Moreira lançava ondas de azedia e amargura no sorriso ama­relo, porque tudo para ele surgia deslocado, revirado... Entre o amigo que lhe fugia ao comando e a jovem, cujo corpo físico se decidia a preservar, sentia-se atônito. Compreendeu, no entanto, que não lhe se­ria lícito incompatibilizar-se com os novos amigos, em face da assis­tência que Cláudio e Marita estavam recebendo. (2a parte, cap. III, pp. 199 e 200)
10. Marita desperta com ódio da irmã - Marita, em vista do aten­dimento espiritual, reassumiu o leme dos centros cerebrais que ainda se lhe mantinham à disposição. Recuperou a sensibilidade olfativa; percebia, raciocinava e ouvia com relativa segurança, mas estava hemi­plégica, destituída da visão e da fala, de modo irreversível. A prin­cípio, pensou estar acordando no sepulcro, como vira em filmes e li­vros de terror. De alma opressa, supunha-se num transe desses, esten­dida ali no leito que tomava por ataúde. Queria gritar, pedir socorro, mas não conseguiu. Sabia que pensava com a própria cabeça, reconhe­cia-se consciente, sentia, memorizava. Recordava os acontecimentos que a impeliram à morte. Arrependia-se. "Se a vida continuava, para que provocar o fim do corpo?", considerava, desditosa. Após rememorar tudo o que sucedera, desde o encontro com o pai, na Lapa, até à queda em Copacabana, pareceu-lhe possuir um corpo de pedra, incapaz de expres­sar-se, e isso a irritou. A jovem fremia de impaciência, de espanto e de dor. Mágoa e revolta, petitórios e indagações esmaeciam-se-lhe, imanifestos, no âmago do ser. E por mais que se empenhasse a chorar, desoprimindo-se, as lágrimas não caíam. Parecia que os olhos e a lín­gua permaneciam desligados do corpo. Estaria morta? Escutou então os passos da enfermeira e registrou a respiração sibilante do pai, sem poder, no entanto, identificar-lhes a presença. Após duas horas de an­gústia recôndita, que Moreira assinalava com acuidade e precisão, Ma­rita se aquietou mentalmente, e André viu que sua mente se fixava, la­mentavelmente, em Marina. Moreira encontrou, então, pasto robusto a nova desorientação. Percebendo-se demitido da complacência de Cláudio, procurava na filha outros motivos em que se lhe facultasse permanecer atrelado à demência. André não poderia pressionar Marita, no sentido de sustar-lhe as lamentações, porque qualquer esforço adicional pode­ria precipitar-lhe a desencarnação. A jovem reconstituiu, assim, na imaginação as aperturas de sua existência e acusava a irmã por todos os infortúnios. Marina figurava-se na tela de sua memória como sendo a inimiga imperdoável, pois lhe furtara as carícias maternas, roubara-lhe as afeições, subtraíra-lhe o eleito dos sonhos juvenis... (2a parte, cap. III, pp. 201 e 202)
11. Moreira promete vingar-se de Marina - De nada valeram as pon­derações que André lhe endereçou. A influência de Moreira, que lhe es­timulava as recriminações, surgia naturalmente muito mais vigorosa para ela, que buscava encontrar simpatia e adesão. Desconhecendo os poderes do pensamento, ela não sabia que, fora da indulgência e da brandura, invocava desagravo e, assim procedendo, não somente enredava a família em duras provações, mas igualmente punha a perder o valioso trabalho de recuperação daquele amigo necessitado de afeição e de luz. Moreira, ao absorver-lhe as confidências mudas, retomava, a pouco e pouco, a brutalidade que anteriormente lhe marcava a expressão. Esvae­ciam-se-lhe as melhoras de espírito e, a pretexto de auxiliar a prote­gida, reavivava os instintos de vingador. Inútil seria qualquer ten­tame para reconduzi-lo à serenidade. Embebendo-se nos queixumes da­quela que classificava como sendo para ele a mulher querida, restau­rava em si mesmo a selvageria da fera sequiosa de sangue. André pediu-lhe calma e tolerância, mas ele, clamando que não, disse que ninguém o faria renunciar à guerra pela tranqüilidade daquela que amava. Alegou, então, desconhecer até aquele momento o martírio que Marina aplicara à irmã, a vida inteira, e insistia no desforço... Ao vê-lo abandonar o serviço que voluntariamente se impusera, incapaz de refletir nas con­seqüências da própria deserção, André compreendeu que o ex-obsessor fora assaltado por crise de loucura, mas não lhe cabia julgá-lo. Com­petia-lhe simplesmente trabalhar, socorrer. Deixando, assim, Marita aos cuidados dos amigos Telmo e Arnulfo, André dirigiu-se à residência dos Torres, único lugar para onde Moreira, com certeza, rumaria. Na casa silente, cochichava-se a medo. Havia lágrimas no semblante dos servidores humildes, porque dona Beatriz, em coma, esperava a morte. Neves e outros companheiros desencarnados rodeavam o leito da enferma. E, minutos depois, ocorreu o que André temia: Moreira, seguido por quatro camaradas truculentos e carrancudos, penetrou o recinto e, sem a menor comiseração pela agonizante, acercou-se de Marina, gritando, encolerizado: "Assassina!... Assassina!..." (2a parte, cap. III, pp. 203 e 204)
12. André é hostilizado por Moreira - Em face da agressão, Marina experimentou irreprimível mal-estar. Empalideceu. Sentiu-se sufocar, registrando todos os sintomas de quem recebera forte pancada no crâ­nio. Os Torres, pai e filho, perceberam-lhe a vertigem e acorreram, pressurosos... Nemésio atribuiu o desmaio à falta de descanso, após uma noite de vigília ao redor de Beatriz. Gilberto trouxe-lhe água fresca e telefonou para o médico. O impacto no ambiente espiritual não foi menos constrangedor. Neves fitou André, irrequieto, como a rogar socorro para não explodir. Uma das senhoras desencarnadas, que aguar­dava o momento de acolher Beatriz, liberta, abordou André, pedindo providências. Moreira e os comparsas despejavam ditérios e obscenida­des, injuriando a dignidade do recinto, depois de haverem burlado a vigilância mantida em torno da casa. Em determinadas terapêuticas, lembrou André, não se pode restabelecer a normalidade orgânica senão removendo o centro da infecção, e ali o pivô da desarmonia era Marina. Afastada a moça, retirar-se-iam com ela os agentes da desordem. Foi o que André fez. Abeirando-se da menina, suplicou-lhe saísse. Fosse re­pousar. Não teimasse ante a solicitação, em seu próprio proveito. Ma­rina obedeceu a contragosto. Pediu licença aos amigos, a fim de espe­rar o médico na dependência dos fundos, e retirou-se, acompanhada por André. Moreira, contudo, o hostilizou, interpelando-o. Por que nutria simpatia pela jovem que ele, Moreira, detestava? Por que se interes­sava por alguém que ele chamava bisca, bonita por fora e devassa por dentro? (2a parte, cap. IV, pp. 205 e 206)
13. Marina expõe seu íntimo a Moreira - Após ser crivado de con­siderações repassadas de fel e desafiado a esclarecer os motivos de sua conduta, André Luiz disse a Moreira que Marina, apesar de tudo, era também filha de Cláudio Nogueira e irmã de Marita, aos quais ambos tributavam calorosa afeição. Qualquer fracasso em prejuízo dela seria desastre para eles. Evidentemente, não lhe cabia reprovar corrigendas; no entanto, por amizade aos Nogueiras, não concordaria em que ela fosse massacrada. Moreira sorriu e observou que as apreciações não eram de todo desprovidas de senso; todavia -- embora prometesse amai­nar o desforço -- não desistiria da correção. Pediu, então, a seus comparsas que lhe aguardassem as instruções no pátio lateral e seguiu a jovem, segurando-a, descortês. Marina penetrou na câmara, encostou a porta e ajeitou-se no leito. Aspirava a dormir, descansar, mas não conseguiu. Moreira resolveu submetê-la, ali mesmo, a um interrogatório em torno de Marita, para provar a André que ele estava certo em seus propósitos de vingança. O indesejável obsessor, erguido por si mesmo à condição de juiz, pespegou um pejorativo contundente aos ouvidos da moça e reclamou-lhe a opinião sobre Marita. Embora debilitada e presu­mindo monologar, Marina deixou que os pensamentos lhe pululassem do cérebro, sem o travão da autocrítica. Compadecia-se da irmã -- admitia --, mas confessava-se agradecida ao destino por se ver livre dela. Lo­gicamente, não teria tido coragem de impeli-la à morte; contudo, se ela própria deliberara desaparecer, sentia-se aliviada. Reportou-se, então, ao telefonema que Marita, sem declinar o nome, fizera a Gil­berto na noite do acidente. Gilberto fora claro. Ele a julgava dese­quilibrada, neurótica e asseverou certa vez que Marita não servia para casar. Ora, se o jovem Torres não a amava e, por isso, ela resolvera sumir, por que preocupar-se? (2a parte, cap. IV, pp. 207 e 208)
14. O obsessor decide puni-la - Em suas recordações, Marina lem­brou ter ouvido da própria mãe que o médico lhe dissera que o óbito de Marita era questão de dias, mas que nada dissesse a Cláudio, visto o pai encontrar-se esmagado de angústia. Essa notícia feriu Moreira nas últimas fibras. Ele não se resignava à idéia de perder Marita no plano físico. Ela, inconscientemente, despendia recursos fluídicos que se casavam com os dele, fornecendo-lhe sensações de euforia, robustez. Retirava dela os estimulantes mentais que lhe vigorizavam a masculini­dade, tanto quanto se valia habitualmente de Cláudio, para viver na Terra como qualquer ser humano. Frustrado e inconformado, designou Ma­rina com um nome chulo e justificou-se diante de André quanto à deter­minação de puni-la. Na sua meditação, Marina dizia amar a Gilberto, sim; apenas a ele. Descobriria recursos para desvencilhar-se de Tor­res, pai. Anelava desposar o rapaz, ser a sua mulher em casa e mãe de seus filhos. Quando, porém, o esboço do lar futuro se lhe configurou na imaginação, Moreira arremeteu-se contra ela e bramiu: "Nunca!... Você nunca será feliz!... Você matou sua irmã... Assassina! assas­sina!..." Marina experimentou estranho mal-estar. Aquelas palavras percutiam-lhe fundo, como se alguém lhe varasse o pensamento. Ofegou em desassossego e começou a refletir, acerca de Marita, sob novos as­pectos. Debalde tentava impugnar o remorso que se lhe infiltrava na consciência. Gemia em desconforto, e, à medida que Moreira martelava as censuras, às quais aderia por saber-se culpada, passou a perder po­sição. O raciocínio enevoava-se-lhe. O contendor desafiara a forta­leza, proclamando-lhe as brechas. A fortaleza resistiria, incólume, se fosse inteiriça, mas as brechas existiam e por elas o inimigo lançava petardos de maldição e sarcasmo, gerando a demência e invocando a morte. (2a parte, cap. IV, pp. 209 e 210)

15. O remorso leva Marina às lágrimas - André, em vão, diligen­ciou no silêncio, articulando agentes mentais de auxílio para que Ma­rina se libertasse, mas a jovem jazia desarmada de conhecimento eno­brecedor que lhe pudesse indicar direção diferente. E, assim, à mercê da força que lhe espatifava os recursos psíquicos, sentia-se der­rotada... Da impassibilidade ante o desastre ocorrido com a irmã, transferiu-se à opressão, ao temor... Imaginou, então, que Marita não buscaria o suicídio, se nela houvesse achado uma companheira honesta e piedosa. Rememorou a noite em que divisara Gilberto pela primeira vez. Ele saía de um cinema, em companhia da irmã, amparando-a contra a chuva. Julgou encontrar ali Nemésio Torres mais moço, e apaixonara-se pelo rapaz. Ao sabê-lo aprisionado à irmã, requintara-se nos processos de sedução. Instalando nele a necessidade dela, tornara-o dependente, escravo, manobrando-o inteiramente, o que a irmã, inexperiente e sin­cera, não se animara a fazer. Perante o libelo do juiz inesperado, perguntava-se, agora, pela tranqüilidade própria, visto que o exame sereno de suas atitudes indicava ter lesado a si mesma... O remorso figurou-se-lhe, então, broca invisível a verrumar-lhe o crânio. Lágri­mas abundantes lhe subiram do peito aos olhos. O médico, ao chegar, apanhou-a em crise de pranto. Sugerindo-lhe repouso, pres­creveu tran­qüilizantes, mas, quando o facultativo saiu, ela retomou o choro con­vulsivo, diante de Nemésio que, intimidado, trancou a porta e tentou confortá-la. Moreira zombeteava, lançando frases ultra­jantes. Nemésio a beijava, referindo-se aos derradeiros arranjos do casamento, que era questão de dias. Diante daquela cena, André convi­dou Moreira a reti­rar-se, mas o obsessor desapiedado, recusando ser julgado, asseverou que detinha tanta culpa na indisposição de Marina quanto a de um bis­turi na ablação de um tumor. (2a parte, cap. IV, pp. 210 a 212)


16. Agrava-se o estado de Marita - André pediu a Moreira lhe auxiliasse, em consideração a Cláudio, a proteger-lhe a filha. Talvez um dia ambos precisassem rogar-lhe ajuda. Por que, então, não ficarem do lado de fora do quarto, resguardando-a? Moreira concordou e eles saíram. Como André lhe pedisse paciência junto dela e de todas as pes­soas em distúrbios do sexo, ele riu-se abertamente e comentou, galho­feiro, que não lhe adiantava falar grego, ante as obscenidades que para ele tinham nome próprio, advertindo-o de que, logo que o pai se retirasse, viria o filho. Foi o que aconteceu. Bastou Nemésio Torres sair, e Gilberto entrou no quarto. Chegou, porém, nesse momento, o ir­mão Félix, que, inteirado de tudo o que acontecera, abriu os braços para Moreira, à feição de um pai que reencontra o filho. Sem qualquer gesto que lhe censurasse a deserção, Félix apelou para o ex-vampiriza­dor com absoluta confiança: "Ah! meu amigo, meu amigo!... Nossa Ma­rita!...", informando-o de que a jovem piorara muito desde o momento em que ele, Moreira, se afastara. Marita necessitava dele, esperava por ele, a fim de aliviar-se... Ante tais frases, que o atingiram no fundo, Moreira acudiu, incontinenti, regressando ao hospital em com­panhia de Félix e André. Realmente, a infeliz criatura se estirava em situação lamentável. Escorada por Telmo, que lhe insuflava energias, Marita não lhe assimilava a influência com tanta segurança. Faltava entre eles aquela harmonia necessária às crenas das rodas de engrena­gem determinada, num plano de sustentação. Telmo, rico de forças, apoiando-a, lembrava um sapato novo e precioso em pé doente. Com Mo­reira de volta à tarefa, verificou-se, de imediato, alguma desopres­são, mas a peritonite instalava-se, dominante, aumentando o mal-estar da filha de Aracélia, que gemia sob a atenção atribulada de Cláudio e, graças aos padecimentos físicos, pensava apenas nas próprias dores, contundida, suarenta, amarfanhada. (2a parte, cap. IV, pp. 213 e 214)
17. Beatriz desencarna - No entardecer do dia imediato, podia-se ver a crescente renovação íntima de Cláudio, que adquirira com Agos­tinho mais amplos recursos de cultura espírita. Moreira também se mo­dificara, ao identificar o resultado de seu esforço junto à enferma. Ele mesmo compreendia que a moça se lhe afinava, com mais segurança, ao apoio fluídico, e regozijava-se com isso. A Providência Divina abençoava o trabalhador bisonho, propiciando-lhe a ventura de contem­plar os grelos promissores das primeiras sementes do bem que ele plan­tava. Moreira sentia-se útil e, por isso, encontrava motivos para con­versar com André e Félix, permutando impressões e solicitando esclare­cimentos, a fim de auxiliar melhor. Cláudio, a seu turno, não se cir­cunscrevia à própria transformação. Desdobrava-se por dispensar à filha todo o carinho e toda a assistência de que era capaz. O genitor não regateava cuidados, nem desencorajava qualquer providência ten­dente a socorrê-la, custasse o que custasse. Ò noite, o irmão Félix retornou ao hospital e, após felicitar Moreira pela tarefa que reali­zava, comunicou-lhes a desencarnação de dona Beatriz. Como a situação de Marita era estável e os serviços se processavam normalmente, o ben­feitor convocou André a dirigir-se à casa dos Torres. No trajeto, disse-lhe estar preocupado com Marina: era indispensável protegê-la contra a obsessão começante. Moreira se afastara, mas permaneciam no pátio da casa os vampirizadores que ele contratara, e eles trariam, inevitavelmente, outros para tumultuar a vida da moça, comprometida pelo remorso. As palavras e a inflexão de voz de Félix acentuavam-lhe a grandeza d'alma, porquanto ele não via em Marina a jovem corrompida, que André e Neves não hesitariam em enquadrar nas linhas da prostitui­ção, nem lhe conferia certificado de aviltamento nas idéias recôndi­tas. Félix reportava-se à jovem como quem menciona terra nobre que a desídia do cultivador entrega à serpente. Marina, na conceituação dele, era uma filha de Deus, credora de veneração e ternura, e con­fiava nela. (2a parte, cap. V, pp. 215 a 217)

7a R E U N I Ã O
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